terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Penhora de salário mínimo não é inconstitucional

"O Tribunal Constitucional declarou, em Novembro do ano passado, que não é inconstitucional a penhora de qualquer percentagem do salário mínimo quando não existem outros bens do executado que possam ser penhorados. Uma posição que surgiu na sequência de uma outra do Tribunal da Relação de Lisboa que recusou aplicar uma penhora de um salário mínimo, considerando que este acautela o mínimo da dignidade humana.
Em causa estava a interpretação conjugada de dois números do artigo 824 do Código do Processo Civil, na medida em que permitiria a penhora de qualquer percentagem no salário de um devedor, mesmo quando este é inferior ao salário mínimo nacional. Ou quando, sendo superior, o rendimento remanescente para o titular fique aquém do salário mínimo nacional.
Ora, no acórdão, publicado no passado dia 16 em Diário da República, uma maioria de conselheiros não julgou como inconstitucional tal leitura. Tendo como argumento central a separação entre uma pensão atribuída pelo Estado (como a Retribuição Mínima Mensal Garantida) e o salário mínimo. Segundo o acórdão, relatado pelo juiz conselheiro Paulo Mota Pinto, o "salário mínimo é uma prestação retributiva do trabalho equivalente ao mínimo que a ideia de dignidade e valor do trabalho (e não da pessoa humana) implicam". O mesmo raciocínio não se aplicara à prestação social mínima, esta sim, com uma finalidade de assegurar o mínimo da dignidade humana.
Esta posição foi de encontro ao parecer do Ministério Público junto do TC. Para o magistrado do MP, o princípio da igualdade não é violado pela circunstância de, "quanto a pensões ou regalias sociais, vigorar um regime de impenhorabilidade total", regime este que não se "verifica necessariamente quando estiverem em causa rendimentos profissionais, mesmo que de montante reduzido".
A tese que vingou não foi, porém, acompanhada pelos juízes conselheiros Mário Torres e Fernanda Palma. Na declaração de voto apresentada, redigida pelo primeiro e subscrita pela juíza, contesta-se o argumento da separação entre pensões sociais e salários. "Cumpre desde logo salientar que do confronto entre titulares de pensões e de vencimentos não resulta necessariamente uma maior debilidade social dos primeiros, bastando recordar os elevados montantes que podem assumir pensões de reforma ou de aposentação", declarou o conselheiro Mário Torres.
O juiz recordou um anterior acórdão do TC (177/2002), no qual se esclarecia que, em matéria de constitucionalidade, a penhora deveria ter em conta, "não qualquer presunção de debilidade, incapacidade laboral ou desprotecção do respectivo titular", mas sim a "consideração de que a penhora deveria salvaguardar o montante mínimo considerado necessário para uma subsistência digna".
Ambos os juízes conselheiros recordaram ainda a declaração de "força obrigatória geral" que teve a jurisprudência fixada no acórdão 177/2002. "Perante esta constatação, surge como destituída de fundamento razoável e, por isso, violadora do princípio da igualdade, a admissibilidade da penhora", só porque num caso se tratava de uma pensão e no outro de um salário."


in Diário de Notícias

1 comentário:

Zacarias disse...

Se bem entendi o T.C. pronunciou-se no sentido de que o chamado ordenado mínimo é susceptível de ser penhorado até ao limite do valor do I.A.S. (Indexante de apoios sociais), o qual é inferior aquele.
Tal decisão, que obviamente ainda não tem efeitos erga omnes, é absolutamente injusta, gritantemente ignominiosa, manifestamente indecente, não havendo sequer justificação ou explicação racional para tamanha e monstruosa decisão. A lei não oferece dúvidas sobre esta matéria, pelo que trata-se de uma invenção e criatividade de criaturas que estão bem na vida e que se estão cagando (perdoe-se o calão)para os pobres. Com juristas destes estamos bem lixados. Com gente deste jaez, o Direito assim não tem futuro. Coitados dos
pobres que são cada vez em maior número. Se esses senhores tivessem presente que se não se tratar, apoiando-os, dos pobres, serão eles a tratar dos ricos.