"O Bloco de Esquerda vai estar isolado, quarta-feira, na defesa do direito de um dos cônjuges a pedir o divórcio pela simples razão de não querer mais estar casado.
A maioria na Assembleia da República rejeita de forma liminar o projecto de lei do BE que estabelece que o cônjuge que não deseje manter-se casado pode, a qualquer momento, pedir o divórcio sem ter que provar a culpa do outro, nem ter que chegar a acordo.
O tema pode dar que falar nas reuniões de grupos parlamentares na próxima semana. "Não é tempo para a Assembleia dar esse salto tão grande", sustentou ao JN o presidente da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Osvaldo Castro. "É complicado prever, juridicamente, o direito de um cônjuge a, de forma abrupta, dizer que vai embora porque se desapaixonou", acrescenta o deputado socialista. "Não será bem compreendido, em especial quando há filhos".
O BE sustenta que a "conotação de dever" associada ao casamento está a dar lugar "à regra do bem-estar pessoal e ao desejo de persistência do amor. Sem ele, ou perante a sua erosão, há motivo suficiente para quebrar o laço". Helena Pinto sustenta que "quando o amor acaba não é preciso que exista culpa". E é a "carga dramática do divórcio litigioso" que o BE pretende suprimir. O projecto prevê a realização de duas conferências de "conciliação" para que "não restem dúvidas de que não estamos a propor o divórcio na hora", sustenta a deputada do BE. (...)
Strecht Ribeiro admite que se possa prosseguir no caminho da redução de prazos do divórcio quando se trata de causas objectivas como a separação de facto, o desaparecimento sem notícias ou o abandono, matéria que já foi alvo de uma iniciativa do próprio deputado e de Alberto Martins na anterior maioria socialista.
António Montalvão Machado, da direcção parlamentar do PSD, sustenta, por seu lado, que "o casamento não é um contrato qualquer. Pode ser terminado por via litigiosa, mas não por via unilateral". Além disso, acrescentou, "permite uma enorme injustiça. Que defesa, que protecção merece o outro cônjuge?", questionou.
Abel Baptista, do CDS-PP, argumenta na mesma linha "O casamento é um contrato muito valorizado. Não pode ser anulado apenas por vontade de uma das partes". (...)
Rogério Alves, bastonário da Ordem dos Advogados, defendeu, em declarações feitas ao JN a título pessoal, que "a via para que aponta o projecto merece, pelo menos, ser estudada". O advogado, disse entender que "o divórcio não pode ser excessivamente facilitado sob pena de se tornar um acto precipitado e leviano", mas sustenta que "é demasiado penoso para um cônjuge que não queira estar casado ter que assacar ao outro uma culpa para se divorciar"."
(Jornal de Notícias)O casamento é, do ponto de vista jurídico, um tema melindroso. Estamos a falar de pessoas e dos seus sentimentos.
O casamento é um contrato, mas possui um requisito, que mais nenhum contrato tem: os sentimentos entre os contraentes, que serve de base à razão de ser desse mesmo contrato. Se um dos contraentes deixar de ter esses sentimentos, essenciais para a celebração (e manutenção, na minha opinião) do contrato, fará sentido manter o contrato?
Claro que se um dos cõnjuges pretender, efectivamente, terminar com o contrato, poderá, por exemplo, abandonar o domicílio do casal, dando, no entanto, um fundamento para o outro cônjuge pedir o divórcio com base na violação dos deveres conjugais. Mas na prática, consegue o que pretende: a separação ou o divórcio.
Concordo com o meu colega, Dr. Rogério Alves, de que o tema deve ser discutido, por exemplo, na especialidade, em sede de Comissão.
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