"O Sindicato do Ministério Público está preocupado com a obrigação de promover a aplicação de penas não privativas da liberdade numa série de crimes elencados na Lei de Política Criminal, considerando que o critério desta orientação é “cego” e que implica que a prisão não possa vir a ser aplicada “em muitos casos que o aconselhariam”, designadamente em situações de reincidência ou de arguidos acusados de uma série de crimes. (...)
Em causa está o facto de a lei determinar a aplicação de penas alternativas à prisão em casos de furto e de burlas não qualificados, na subtracção de menores e no tráfico de estupefacientes de menor gravidade, entre outros, ao mesmo tempo que impõe ao Ministério Público o recurso das decisões judiciais que não acompanhem estas orientações. (...)
INDEPENDÊNCIA
O artigo 16.º da lei, que prevê que o Ministério Público recorra ou reclame das decisões judiciais que não acompanhem as orientações da lei de política criminal, é mesmo visto pelo sindicato como o “mais gravoso e preocupante” por “impedir o exercício da consciência jurídica do magistrado do Ministério Público na avaliação da justiça concreta da decisão judicial”.
Por outro lado, o recurso obrigatório é visto como uma “condicionante à independência do juiz no momento da decisão”.
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses não foi chamada a pronunciar sobre a primeira Lei de Política Criminal, que deverá entrar em vigor em Setembro, mas contactado pelo CM, o presidente do sindicato, António Martins, admite que a previsão do recurso obrigatório seja “duplamente errada”: “Não é pela via de se atingir a autonomia dos magistrados que se alcançam os objectivos subjacentes à Lei de Política Criminal”, Também o Conselho Superior do Ministério Público no seu último parecer aconselha a exclusão da obrigatoriedade de recurso.
REFORMA
A questão dos pequenos furtos é uma das matérias que mais críticas tem suscitado na reforma penal estudada pela extinta Unidade de Missão dirigida por Rui Pereira.
No âmbito do Código Penal, os crimes de furto que envolvam um prejuízo inferior a uma unidade de conta, cerca de 96 euros, passam a depender de acusação particular, o que implica, por parte do lesado, a constituição de assistente no processo e o pagamento das respectivas custas judiciais, perto de 200 euros, ou seja, o dobro do prejuízo.
Esta alteração foi vista como uma “descriminalização encapotada” de um certo leque de crimes, designadamente de furtos, danos e burlas simples, como a subtracção de produtos de estabelecimentos.
NORMAS QUE NÃO EXISTEM
A três meses da data prevista para entrar em vigor, a primeira Lei de Política Criminal, que começou por ser muito criticada pelo vasto leque de crimes considerados prioritários, está longe de gerar consensos.
Um dos problemas que se adivinha é a articulação com os novos códigos, em processo de revisão. A lei deverá ser posta em prática a partir de Setembro, com base em normas que ainda não existem, uma vez que os novos códigos Penal e de Processo Penal só serão aprovados mais tarde. (...)"
(Correio da Manhã)
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