terça-feira, 5 de junho de 2007

Pinto Monteiro em entrevista

"Passaram nove meses desde que tomou posse. Qual tem sido a sua maior dificuldade?
O dia só ter 24 horas.

E a sua maior prioridade?
O Ministério Público contribuir para uma Justiça ao serviço do cidadão e em que este acredite.

Encomendou um estudo sobre comportamentos corruptivos que aponta a administração local como o principal foco. Porquê?
Limitei-me a pedir a conclusão de um estudo encomendado antes da minha posse. Diga-se, contudo, que quanto mais se souber sobre o fenómeno corrupção melhor se pode combatê-lo.

E os autarcas são os mais vulneráveis?
A corrupção abrange todas as áreas.

A simplificação dos processos de licenciamento, é um factor que reduz a corrupção?
A burocracia facilita a corrupção.

Estão, neste momento, em investigação vários processos sobre a Câmara de Lisboa. O seu desenrolar terá em conta que estamos a viver um processo eleitoral?
A decisão do Ministério Público pode influenciar a campanha.

Na divulgação de uma decisão terá em conta este processo eleitoral?
O Ministério Público não pode esquecer que a sua actividade se insere na realidade social, económica e política do país. O Direito regula as relações humanas, não sendo um mero exercício de abstracções. sempre com respeito pela legalidade, haverá que evitar aproveitamentos políticos que possam ser feitos com os processos pendentes. Nem sempre se terá conseguido esse objectivo, mas é intenção firme do Procurador-Geral da República defender essa ideia base. No que em concreto respeita ao processo eleitoral em curso, seguir-se-á o princípio referido, procurando evitar-se que as decisões a proferir tenham reflexos, directos ou indirectos, nas eleições.

Numa entrevista que deu recentemente à RTP tentou desmistificar a figura do arguido. Este conceito deve ser alterado, ou deve apenas o país compreender que não se trata de uma condenação à priori?
A intenção do legislador ao conceitualizar a figura de arguido com os contornos que tem na nossa lei, foi a de criar mecanismos de defesa do cidadão. A ideia não resultou. No presente, para o homem médio o arguido é o culpado, o réu. O conceito vai ser alterado, passando a exigir-se para que alguém seja constituído arguido, que existam “fundadas suspeitas”, o que vai provocar modificações. Hoje, o país está cheio de arguidos inocentes (ao lado, evidentemente, de culpados).
(...)

Concorda com a necessidade que o legislador sentiu ao alterar o artigo do Código de Processo Penal sobre a violação do segredo do justiça, colocando como potenciais violadores os que têm acesso indirecto e lícito a dados processuais protegidos pelo segredo de justiça?
É necessário alterar o Código de Processo Penal no que respeita ao segredo de justiça. Além do mais é preciso “emagrecer” o conceito.

Qual é a quota de responsabilidade da estrututra do Ministério Público nas violações do segredo de justiça?
Não há inocentes no que toca às violações do segredo de justiça.

Estudos internacionais (como é o caso do divulgado pela ‘Finantial Action Task Force’) apontam para falta de coordenação entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público no combate aos crimes económicos. Sente essa falha?
É preciso melhorar a coordenação.

Em que termos concretos?
Será necessário redefinir em diploma próprio o que é ou não específico da competência da Polícia Judiciária nesse campo.
(...)

Portugal tem uma das mais baixas taxas de condenações em crimes económicos em toda a União Europeia. O que tem corrido mal? Polícia Judiciária e Ministério Público chegam tarde demais ao “cenário” do crime? Existe falta de coordenação entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária? Como se previne um crime económico?
No que respeita à prevenção, investigação e prova do crime económico muita coisa há a mudar e a aperfeiçoar. Uma delas é a maior especialização das magistraturas e das polícias; outra é a criação de um forte juízo de censura ética por parte do homem médio, que só há alguns anos tem despertado para este tipo de crime. É preciso afastar as ideias de que “todos se governam” e de que “enganar o Estado não é crime”. Ao nível das infracções fiscais tem existido uma acentuada melhoria nos dois aspectos que foquei.
(...)

Ajuda no combate a crimes económicos uma PJ com uma unidade específica de combate à corrupção?
São necessárias unidades especializadas em vários campos.

Vai alargar a criação de equipas especializadas para ‘mega-processos’ seguindo o exemplo do Apito Dourado?
Sou adepto da ideia, que está em estudo.
(...)

(Diário Económico)

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