quinta-feira, 13 de maio de 2010

Febre

A visita papal a Portugal tem estado envolvida numa autêntica febre mediática. Desde as tolerâncias de ponto às emissões televisivas, quase não se fala de outra coisa.
Antes de mais, não posso deixar de criticar a submissão ao Papa. O Estado, supostamento laico, curvou-se à Igreja. Sócrates, com as sondagens a pressioná-lo, e Cavaco, com as presidenciais à porta, fazem o sacrifício de ir ao beija-mão papal, na expectativa de ganhar votos e a simpatia dos eleitores mais religiosos. Em troca, temos um país parado. O Ensino está cada vez pior, mas as escolas (as públicas) fecham portas. A Saúde não trata de todos os doentes e a lista de espera é de meses, mas as cirurgias e as consultas foram desmarcadas ou adiadas. A Justiça é lenta e os processos levam anos, mas os tribunais estão quase fechados e os julgamentos adiados. O país, numa grave crise, está parado, tudo por causa de uma única pessoa. Como é que uma pessoa só consegue parar um país durante quatro dias?
Por falar em crise, quem é que paga a visita papal? Já ouvi falar em valores que ascendem a 80 milhões de euros, mas quem paga? Os contribuintes, que terão que pagar mais impostos, mais juros, perdem o emprego? Dizem-me que as doacções podem chegar para pagar as despesas. Mas de onde vêm as doacções? De onde vem o dinheiro? Quem dá o dinheiro? E se dão à Igreja, porque não dão a quem precisa, aos pobres, ao Estado, para equilibrar as contas públicas? É que o Vaticano é só o estado mais rico do Mundo, cuja riqueza (a declarada) daria para acabar com a fome do Mundo, mas está parada ou nos museus do Vaticano (em jóias) ou nas contas bancárias.
E quem paga os figurinos para irem para as ruas gritar "viva o Papa"? Não há católicos suficentes para encherem as ruas?
Por falar em dinheiro, como é que a Paróquia de Fátima tinha 60 milhões de euros para pagar, a pronto (em cash), a obra do novo Santuário? As esmolas não são para os pobres? Ou são, afinal de contas, para ficarem nas contas a render juros?
Por falar em riqueza, como é que o Papa pode falar em fazer vida de pobre, quando calça sapatos Prada (cada par custa 2000 euros) e tem uma vida de luxo? A luxúria e a soberba (vaidade) não são dois dos sete pecados capitais?
Sinceramente não compreendo como é que as pessoas ficam tão malucas por uma só pessoa, seja um cantor, um actor, um político, um futebolista ou um líder religioso. Especialmente quando é um homem como todos nós, com as virtudes e os defeitos de todos os humanos.

2 comentários:

victor rosa de freitas disse...

Caro Ricardo:

Não vou fazer qualquer crítica à sua posição. Apenas direi que este Papa SABE, no sentido espiritual do termo. Como tal, move milhões de seres humanos em todo o Mundo e merece o respeito de todos, políticos ou não, seja qual for a sua condição social ou económica. A sua (dele, Bento XVI) mensagem cristã PASSA, acredite-se ou não.

Cumprimentos

Ricardo Sardo disse...

Caro Victor, agradeço o comentário.
Não se trata de uma questão de Fé. Ou se tem ou não se tem. E ambas as posições devem ser respeitadas por quem pensa diferente. A determinada altura da minha vida, começei a pensar na Fé, a reflectir sobre a existência ou não de um Deus, a questionar os fundamentos das religiões, em especial a Católica. Mas, apesar de ter deixado de acreditar em Deus, sempre mantive o máximo respeito por quem acredita, bem como pela Instituição. Mas, lá por respeitar a Igreja, não significa que não possa questionar certas posições ou criticar determinadas opções. O que escrevi foi um desabafo, pois não consigo entender tanta admiração por alguém, seja um líder espiritual, seja uma outra figura pública qualquer. Note que generalizei a questão, pois o mesmo acontece, por exemplo, com adolescentes em relação a certos cantores ou bandas.
As critícas que fiz no texto visam apenas apontar as contradições da Igreja Católica. Ao contrário de outros, não me dá gozo atacar a instituição ou o Papa ou os padres. Como me costuma ler, sabe que até já defendi a Igreja em certos momentos, apesar de ser um ateu convicto. Simplesmente não posso ficar calado perante estes factos. Um familiar meu, católico convicto, faz as mesmas critícias. Pois, apesar de acreditar em Deus e praticar a Fé não gosta que a Igreja, constiuída por homens, faça algumas das coisas que faz e defenda posições altamente criticáveis. Podia, sobre isto, até falar aqui dos regimes ditatoriais que a Igreja defendeu e defende. Mas já nem entro por aí...
Cumprimentos.