sexta-feira, 24 de julho de 2009

Responsabilidade civil

"O Estado vai ter de responder, em qualquer circunstância, pelos danos causados pelo fármaco Avastin, ministrado nos seis doentes internados no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, que no decurso de intervenção clínica perderam a visão.
A garantia foi dada à Rádio Renascença pelo juiz desembargador Eurico Reis, para quem o facto da farmacêutica que comercializa o medicamento ter advertido contra possíveis danos em caso de uso oftalmológico, isentam-na de toda a responsabilidade.
Face a esta situação, o magistrado não tem dúvidas de que terá de ser o Estado a indemnizar as vítimas pelos danos causados pelo Avastin, ainda que podendo depois exigir o direito de regresso sobre os responsáveis pelo acto médico causador do dano, caso se prove que actuaram dolosamente ou com mera negligência.
No entender de Eurico Reis, o facto de o director do hospital ter já garantido que assumirá todas as responsabilidades significa que o Estado admite um acordo extra-judicial com as vítimas, as quais deverão ser indemnizadas na exacta medida do dano que lhes foi causado pela aplicação do Avastin."

(Diário Digital)

Esta notícia merece alguns comentários/questões:

1) Com que legitimidade é que um Juíz (neste caso, Desembargador) vem a público pronunciar-se sobre um caso concreto, caso esse que até pode chegar a Tribunal e, mais concretamento, ao seu (Tribunal da Relação)?

2) Como que legitimidade é que um Juíz vem a público pronunciar-se sobre um caso concreto, sem conhecer, em pormenor, todas as circunstâncias envolventes, formulando conclusões inequívocas, dando garantias que terá determinado desfecho?

3) Como é que o Estado responderá, "em qualquer circunstância", se existe a real e forte possibilidade de a responsabilidade ser apenas do(s) médico(s)?

4) Como que fundamento é que um Juíz diz que o Estado é responsável, se o Código Civil diz que apenas o será se o erro foi provocado, dolosa ou negligentemente, pelo Hospital (entidade integrante da Administração Pública, do Estado)?

5) Com que fundamento é que um Juíz atribui esta certeza se acaba por reconhecer que o Estado terá direito de regresso sobre os médicos responsáveis? Se a culpa é deles, como é que o Estado pode ser - legalmente, entenda-se - responsabilizado?

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Leituras

1. "Um bom exemplo de como funciona a corporação da Justiça é a polémica gerada em torno do novo Campus. Antes queixavam-se que os Tribunais estavam decrépitos, não reuniam as mínimas condições, eram inseguros… Feita a mudança para um local à beira rio novinho em folha (como já tive oportunidade de comprovar), as antigas instalações passaram a ser fantásticas, cheias de carisma e de memória que urge preservar e, pois claro, as novas são péssimas, perigosas, fora de mão, com um ar condicionado barato, etc. etc. etc.
Em Portugal, nomeadamente para as corporações instaladas e sindicatos, a palavra mudança (nem que seja só de local de trabalho) é intolerável… Parece que está entranhado no nosso sangue um permanente sentimento de anti-mudança e de inadaptação. Nunca estamos bem, vamos sempre andando...
O problema disto é que o mundo é uma realidade em permanente mutação e só vence quem se adapta. É uma chatice…"

(Francisco Proença de Carvalho)


2. "Se algum dos magistrados que trabalha no Parque das Nações quiser trocar o seu gabinete com o meu estou disponível para a troca. Até compreendo algumas das razões mas quando invocam o estatuto de órgão de soberania cheira-me a luxo, até parece que querem um palácio."

(O Jumento, sem link directo)

O comportamento de um órgão de soberania

Têm toda a razão e concordo com as críticas que são feitas ao Campus da Justiça. Eu também já fiz algumas aqui. Este texto, por exemplo, aponta vários erros, que terão, necessariamente, que ser corrigidos o quanto antes. Mas a forma escolhida por 16 juízes e alguns magistrados do Ministério Público de manifestar a sua insatisfação - faltarem à cerimónia oficial de inauguração do Campus - vai contra o que considero ser o comportamento adequado de um órgão de soberania. Se querem ser tratados como elementos de um órgão de soberania, têm de se comportar como tal, o que não aconteceu neste caso.
Compreendo que seja claramente preferível trabalhar no coração de Lisboa, com, por exemplo, transportes "à porta" e num edifício com um passado e uma História que devem permanecer na memória de todos. Mas a Boa Hora já não tinha o mínimo de condições, nem para quem lá trabalhava nem para quem lá ia. Defender a continuação na Boa Hora, naquelas condições, parece-me ser uma atitude à "velho do Restelo". O Ministério da Justiça deve ser chamado à razão por todos os operadores da Justiça, mas não é desta forma, desprezando uma cerimónia oficial, que se garante dignidade à reinvindicação.

Mais uma má Lei

"A Comissão Nacional de Eleições (CNE) classificou de "esquecimento" o facto da lei que define a isenção dos partidos políticos no pagamento de IVA nas campanhas eleitorais não regular o financiamento das candidaturas independentes.
Ao contrário dos candidatos autárquicos propostos por forças políticas, os independentes suportam o IVA, a uma taxa de 20 por cento, do material que compram para difundir a sua mensagem política e estão impedidos de vender bens ou artigos, para angariar fundos, sem cobrar o IVA. (...)"

(Jornal de Notícias)

Acontece que esta má Lei prejudica muita gente e é mesmo, salvo melhor opinião, inconstitucional. Urge, assim, uma alteração ao diploma para corrigir este grave erro.
Quanto às responsabilidades, estamos em Portugal, por isso ninguém dirá "mea culpa" nem assumirá o erro, como sempre. A incompetência não tem punição nem consequência. Portugal no seu melhor...

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Mais seriedade, s.f.f.

É engraçado ler as crónicas de Carlos Abreu Amorim no Correio da Manhã. Na segunda-feira, escreveu que Isaltino Morais tinha violado "o seu estatuto de arguido", ao ter abandonado a sala de audiências enquanto o Procurador alegava e, já fora da sala, ter falado aos jornalistas.
No Blasfémias, blogue onde escreve, desmontei, um por um, os argumentos de CAA (comentários 11, 26, 30, 38, 39, 40, 41, 46, 57, 61, 66, 71).
Ontem, escreveu (no CM) que sugere "que a ASAE, agora, vá autuar os responsáveis pela salgalhada da sua criação e, logo a seguir, se feche a si mesma sem hesitações. Afinal, só estariam a cumprir a lei e a Constituição". Eu pergunto ao Carlos: com base em que norma é que a ASAE é ilegal (ou inconstitucional)? Eu bem sei que o Carlos é "apenas" jurista, não é advogado, mas podia dar ouvidos ao seu colega de blogue, o Carlos Loureiro, que, por acaso, até é advogado. O Carlos Loureiro explica, muitíssimo bem, porque não é a ASAE que é inconstitucional, mas apenas a sua actuação e os seus poderes como órgão de polícia criminal. O CL escreveu aquele texto bem antes do CAA ter escrito a sua coluna para o CM, por isso não compreendo como é que o CAA insiste num erro, quando até foi desmentido, à priori, pelo CL.
Eu bem sei que o CAA tem por hábito emitir conclusões e opiniões com base no "porque sim" em vez de fundamentos e argumentos, mas ficava-lhe bem, ainda por cima porque escreve para o jornal mais lido em Portugal, dizer coisas mais acertadas. O leitor agradece...

Formalidades

Cada vez mais, vejo colegas que vão a Tribunal sem gravata.
Uma coisa são diligências consideradas menos formais, como primeiros interrogatórios, debates instrutórios, audiências de partes ou audiências preliminares, onde nem sequer é usada toga (ou beca, pelos magistrados) e muitos magistrados também deixam a gravata de parte. Mesmo aqui, já tenho visto colegas de calças de ganga, ténis e camisas por fora ("desfraldados"), o que considero um abuso e uma atitude que em nada dignifica a profissão, apesar de estar na moda vestir a camisa ao estilo de Paulo Portas, aberta até quase ao umbigo... Aliás, uma vez, num debate instrutório, a magistrada do MP vestia t-shirt, calças de ganga, ténis e usava piercing no nariz, mas isso são os magistrados, é com eles...
Outra, bem diferente, já é uma audiência de julgamento, onde as formalidades devem ser, a meu ver, respeitadas. Ir para um julgamento sem gravata é, também, um atentado à dignidade e um acto de desconsideração para com o Tribunal e os restantes intervenientes no processo.
Nesta altura do ano, com o calor a chatear, costumo andar com roupa mais fresca e menos "formal", mas para diligências mais formais visto o fato e uso gravata. Porque considero que é, acima de tudo, uma questão de respeito pelos outros.

Agenda


terça-feira, 14 de julho de 2009

Julgamento antecipado

Esta notícia do Correio da Manhã padece de um enorme vício: dá como provada a acusação (suspeita, já que nesta fase nem sequer existe ainda uma acusação, mas apenas indiciação). Não é "alegado violador" mas apenas "violador","pedófilo" e "abusador".
Este tipo de abordagem jornalística acaba, invariavelmente, por influenciar a opinião pública, sobretudo a que deconhece os trãmites legais e o termos jurídicos. Quem lê este tipo de notícias, acaba por aceitar a ideia de que os suspeitos dos crimes noticiados são mesmo culpados, quando ainda nem sequer a julgamento foram.

Não querendo imiscuir-me na actividade jornalística, parece-me que se deveria ter mais cuidados nestes pormenores, sobretudo a imprensa sensacionalista. É que depois, caso não se prove a culpabilidade do suspeito (neste, como em todos os casos), a opinião pública fica com a sensação de que não foi feita Justiça, tendo o Tribunal libertado um criminoso...

ASAE inconstitucional? (3)

O Acórdão da Relação de Lisboa julgou "inconstitucional os arts. 3º/aa) e 15.º do DL 274/2007, de 30 de Julho por violação do art. art. 164.º/u) da CRP."
Ora o artigo da CRP a que se refere é o do regime das forças de segurança. Ou seja, os dois artigos do diploma que conferem poderes de órgão de polícia criminal à ASAE (DL 274/2007) são inconstitucionais, pois esta matéria é da reserva absoluta do Parlamento. Isto é, nem com autorização daquele, o Governo poderia legislar sobre esta matéria.
Assim, não restam dúvidas de que todas as diligências realizadas pela ASAE ao abrigo destas duas normas são ilegais.

ASAE inconstitucional? (2)


O Tribunal da Relação concluíu, num processo concreto, que a ASAE é inconstitucional. Isso significa apenas que, nesse processo, o visado não terá qualquer sanção nem será condenado pela prática de nenhum ilícito. Vou dar um exemplo: um comerciante vê a ASAE encerrar-lhe o estabelecimento comercial e aplicar-lhe uma coima (abre, portanto, um processo de contra-ordenação). O comerciante recorre para o Tribunal, este pode lhe dar ou não razão e há recurso para a segunda Instância, o Tribunal da Relação. Aqui, os Juízes determinam que a ASAE não tem legitimidade para abir processos de contra-ordenação, nem aplicar sanções como coimas e encerramento de estabelecimento comercial, pelo facto de o organismo estar ferido de inconstitucionalidade orgânica. É, portanto, dada razão ao comerciante. Claro que pode haver recurso para o Tribunal Constitucional, para apreciar a eventual inconstitucionalidade do órgão de polícia. Mas só depois de três acórdãos deste Tribunal nesse sentido é que a ASAE deixará de funcionar como tal.

Assim, a reacção do Governo, apesar de correcta do ponto de vista jurídico, padece de uma consequência desta decisão: a ASAE abre processos e realiza diligências que, depois em Tribunal, são anulados. Isto significa que ou o Governo corrige o problema, ou poderemos ter uma sucessão de decisões judiciais contra a ASAE e a favor dos comerciantes e alegados infractores. O País não pode, pois, estar carente de uma autoridade legalmente competente para detectar e punir as violações às regras de segurança, higiene, etc, como parece estar neste momento.
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Nota: segundo fonte do Ministério, "a técnica legislativa utilizada na criação da ASAE foi a transferência automática dos poderes que já existiam na extinta Inspecção-Geral das Actividades Económicas (IGAI)". Ora, salvo melhor opinião, a mera transferência automática de competências de um organismo para outro passa pela elaboração de diplomas que estabelecem desde a extinção do anterior organismo à criação do novo e, como explicado no post anterior, isso foi feito sem autorização do Parlamento. Como escrevi, este Governo é pródigo em más técnicas legislativas e más leis.

Leituras

"A justiça é hoje um dos temas que mais preenche o debate político em Portugal. Basta verificar o alinhamento dos telejornais, reparar nos múltiplos artigos de opinião e estar atento ao mundo da blogosfera e dos comentários online, e perceberemos que a discussão sobre a justiça e a sua aplicação se generalizou. Seja por efeito de novos protagonistas, mais mediáticos que sensatos, seja por efeito de um novo paradigma informativo - que não distingue curiosidade de transparência - ou seja mesmo por efeito de um sentimento dominante que transforma opinião em certeza, a verdade é que a velha justiça discreta, senhorial e distante, foi dando lugar a uma justiça lenta, vulgar e discutível. Hoje, não há acto judicial que não seja debatido por qualquer pessoa, em qualquer lugar e para qualquer audiência.
E não nego que até invejo a capacidade de muitos dos meus concidadãos na perspicácia e certeza na avaliação da prova, na inteligência infalível com que compreendem os motivos e na assertividade com que condenam ou absolvem. Os portugueses fazem hoje parte de um grande juri. A Justiça vulgarizou-se.
Querem um exemplo?
Relembremos o recente elogio à exemplar justiça americana pela forma como prendeu e julgou em 6 meses o poderoso Madoff, condenando-o em 150 anos de prisão, sem olhar ao estatuto, sem pestanejar na fortuna. "Em Portugal seriam 150 anos de julgamento para 6 meses de pena suspensa", gracejava-se em todo o lado.
É este o risco da vulgarização.
Porque Madoff defraudou meio mundo e toda a América durante décadas impunemente. Porque nunca foi descoberto e preso, entregou-se. Porque, no julgamento, quase não houve prova, confessou. E porque 150 anos de prisão são gratuitos, quando Madoff não poderá viver nem um quinto desse tempo. Um caso que envergonha a América nunca será prova senão de ineficácia.
Mas este exemplo não diminui a importância do verdadeiro risco de divórcio entre a sociedade civil e o funcionamento dos tribunais. E esse risco não é conjuntural; é sistémico.
Porquê? Porque a função soberana de aplicar a justiça é a única soberania cuja legitimidade não assenta na origem, assenta no resultado. Isto é, ao contrário dos outros órgãos (PR, AR e Governo), cuja legitimidade decorre do voto da sociedade, os Tribunais baseiam a sua legitimidade no resultado da sua acção. Pôr em causa a sua eficácia, é pôr em causa a sua legitimidade.
Por isso, quando se inicia a campanha eleitoral, era bom recordar que se a justiça é séria demais para ser entregue a cada um, também é séria demais para ser resolvida no tribunal da opinião pública. Esperemos que, por isso mesmo, venha a fazer parte da agenda dos consensos e não da agenda das disputas."

(António Ramalho, no Diário Económico)

ASAE inconstitucional?

"Os juízes da Relação de Lisboa consideram insconstitucional a transformação da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica em polícia criminal porque resulta de legislação elaborada em 2007 sem autorização do Parlamento. (...)
O alargamento de competências da ASAE, aprovado pelo Governo atribuiu a esta autoridade poder para fazer apreensões, detenções e até mesmo escutas telefónicas. Ao contrário do que acontece com as restantes entidades com poderes de policia criminal (SP, GNR, PJ e SEF) que foram legisladas no Parlamento ou com a sua autorização, neste caso, os deputados não foram ouvidos sobre as mudanças."


(Diário Económico)

O artigo 165.º, nº1 al. b), da Constituição da República Portuguesa estabelece que "é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: Direitos, liberdades e garantias."

Ora, tratando-se de matéria relacionado com meios de obtenção de prova em matéria criminal (apreensões, escutas telefónicas) e detenção de pessoas, apenas a AR ou o Governo, mediante autorização desta, pode legislar sobre este assunto. Não existindo autorização do Parlamento, o diploma que regula o funcionamento e os poderes da ASAE está ferido de inconstitucionalidade orgânica.

Adenda: este é mais um exemplo de como este Governo é, em matéria jurídica, medíocre. Quem elaborou este diploma teria, como jurista, de saber que necessitaria de autorização da Assembleia da República.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Palma...da

Mais uma palmada do Dr. João Palma. Começo a questionar se fala como Presidente do sindicato dos Magistrados do Ministério Público ou se como político de um qualquer partido da oposição. As críticas que desferiu hoje ao governo e à maioria parlamentar são totalmente inadmissíveis para quem sabe, ou deveria saber, que a separação de poderes o obriga a não pronunciar-se sobre os poderes legislativo e executivo.
Já não é a primeira vez que o Dr. Palma faz acusações ao governo e ao PS. Ainda não tinha sido eleito, já "malhava" com as alegadas pressões de Lopes da Mota. Claro que quem anda na Justiça sabe - e o Dr. Palma muitíssimo bem - que aquelas "pressões" não são nada comparadas com outras que não vieram a público. Porém, essas não servirão os interesses político do Dr. Palma...
Cada vez se percebe mais as intenções do Dr. Palma. Mas quem sai a perder é a Justiça e os próprios magistrados do MP, pois quem fica mal visto são eles. Mas isso o Dr. Palma não percebe...

O Campus e o estado da Justiça

Esta notícia do Correio da Manhã só espanta quem não conheça o Campus da Justiça. Já lá estive várias vezes e não consigo perceber como pode o Estado gastar milhões de euros em instalações que, apesar de modernas e com óptimas condições, não está preparado para acolher tribunais, sobretudo criminais, com todas as suas vicissitudes e especificidades. Já nem vou falar sobre a localização (Parque das Nações) que tem suscitado imensas críticas, seja pela distância do centro de Lisboa, seja pela distância dos transportes públicos (metro e comboio a 1 km, ou 10 minutos "a pé"), seja pela enorme dificuldade de estacionamento (o tribunal tem um parque, mas é pago, mesmo para os advogados).
O Dr. Carlos Alexandre é um dos magistrados mais conhecidos do país, devido aos casos mediáticos e/ou sensíveis que lhes passa pelas mãos. Já tive a oportunidade de o conhecer e estou certo de que não terá ficado calado com tanta ignorância dos responsáveis pela instalação dos tribunais em instalações totalmente inadequadas.
Este é apenas mais um exemplo de como a nossa Justiça não melhora. E a culpa toda a gente sabe de quem é: dos sucessivos governos e ministros da justiça!

O programa Citius e os Tribunais

"Um estudo da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) revela que 75 por cento dos juízes dizem que o tempo gasto com o expediente diário aumentou "114 por cento" desde que utilizam o sistema informático CITIUS.
Segundo as conclusões do inquérito (...), o tempo médio de cada despacho de expediente passou de 3,5 minutos para 7,5 minutos, sendo a "média do aumento do tempo gasto de 114 por cento".
Por essa razão, os magistrados inquiridos pela ASJP - que representam 13,3 por cento do total que actualmente utiliza o CITIUS - avaliam negativamente a eficiência e rapidez do CITIUS, que desde há seis meses tem utilização obrigatória nos tribunais cíveis, laborais e de família e menores.
Simultaneamente, 60 por cento dos juízes questionados dizem não confiar na fiabilidade e segurança do programa informático.
Essa avaliação negativa leva a ASJP a apresentar como conclusão preliminar que a utilização obrigatória daquele programa "prejudica gravemente a eficiência dos tribunais, o que vai traduzir-se em menor celeridade".
O inquérito conclui ainda que "a desmaterialização dos processos é desnecessária, não traz vantagens visíveis e prejudica gravemente a eficiência da resposta judicial".
"Esta reforma legislativa vai ter reflexos muito negativos e duradouros na produtividade dos tribunais, ao nível do número de processos findos em cada ano", conclui o estudo, realçando também que "os equipamentos informáticos disponibilizados são inadequados e prejudiciais para o conforto e saúde dos utilizadores".
Na opinião da ASJP, "todo o projecto" informático deve ser "repensado de alto a baixo" antes de se levar "adiante a intenção governamental de alargamento da obrigatoriedade de utilização do CITIUS no processo penal". O contrário, insiste a associação, "será totalmente insensato".
Outros aspectos negativos prendem-se com a impossibilidade de consulta dos processos nos julgamentos e de trabalhar nos processos fora do gabinete do tribunal, indica a ASJP.
O aumento do número dos passos necessários para a prática do mesmo acto é outro ponto negativo referenciado, exemplificando-se: a simples assinatura digital de uma acta de julgamento implica, já com o sistema informático aberto, cinco operações informáticas sucessivas, que podem demorar minutos.
Também a "deficiência e inadequação da informação relevante disponibilizada nos menus do sistema e um processador de texto inadequado" são outros pontos críticos apontados ao CITIUS. Mas o inquérito também realça aspectos positivos do programa, nomeadamente uma maior facilidade de controlo dos processos pendentes para decisão e do cumprimento atempado dos actos processuais pela secretaria judicial, a facilitação do trabalho dos funcionários judiciais e uma maior facilidade de acesso aos actos processuais pelos advogados.
Como sugestões de melhoria do sistema são propostas pela associação "maior rapidez dos servidores informáticos, simplificação gráfica e funcional do sistema, melhoria dos equipamentos informáticos e necessidade de manter registo em papel de todos os actos processuais"."

(Diário de Notícias, 9.7.2009)

Lido este estudo, fico convencido de que tal não passa de uma reacção "à velho do Restelo". Na Faculdade um professor (actual deputado na AR) disse-nos uma vez: "quando forem advogados, juízes ou procuradores, serão todos conservadores, serão todos contra as alterações legislativas, pois não terão paciência para estudar e se adaptarem aos novos diplomas". E com o Citius passa-se isto mesmo. A mudança para um sistema totalmente inovador e moderno inplica, sempre, enormes dificuldades e exige vontade de adaptação, sob pena de tudo o que é novo nos parecer mau e/ou errado, o que não é o caso. O Citius tem alguns defeitos, mas, no geral, é positivo e um enorme avanço na Justiça.

Vale a pena ler esta opinião do Sérgio de Almeida Correia, pois toca em algumas feridas da Justiça.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Ele há cada coisa...

Ao encontrar uma colega em Tribunal, esta disse-me que tinha falecido o nosso antigo professor de processo civil, ilustre advogado e brilhante civilista. Incrédulo, perguntei-lhe se tinha a certeza e ela garantiu-me ser verdade. Inconformado e depois de uma pesquisa no google sem resultados, decidi ligar para o escritório a confirmar a veracidade de tal notícia. Felizmente, não era verdade. Ele há cada coisa...

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Cautela

Quem lê este título pode pensar que os Tribunais deram mesmo razão às empresas farmacêuticas. Mas não. Pelo menos para já...
Na peça pode ler-se que "os tribunais administrativos aprovaram 26 das 31 providências cautelares interpostas pelas farmacêuticas com o objectivo de suspender a entrada no mercado de medicamentos genéricos". Ora uma providência cautelar é uma medida... cautelar, provisória, que visa assegurar o efeito últil da decisão final (sentença) enquanto a acção principal é discutida e analisada. Ou seja, os tribunais ainda não se pronunciaram sobre o mérito da questão (não dando, por isso, razão a nenhuma das partes), mas apenas decidiram suspender a comercialização de alguns genéricos.
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Adenda: o Miguel Carvalho diz o mesmo com um exemplo excelente.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Imbróglio resolvido? (2)

Percebem agora porque defendo esclarecimentos públicos em certos casos judiciais? É que, assim, ninguém compreende a Justiça.

Imbróglio resolvido?

"Num despacho emitido no dia das eleições, a que a Agência Lusa teve acesso, um juiz da 9.ª vara considera não existir "qualquer título executivo judicial susceptível de ser executado" e multa Bruno Carvalho em cerca de 190 euros por "falta de prudência" no requerimento que pedia a execução da citação ao Benfica.
Segundo o juiz, "não foi proferida sentença de mérito, quer de procedência, quer de improcedência" na providência cautelar da suspensão da deliberação da Mesa da Assembleia-Geral que admitiu às eleições a Lista A, liderada pelo actual presidente do clube, Luís Filipe Vieira.
O despacho, que responde ao pedido de execução da citação, adianta que "do artigo 397.º, nº3, do Código de Processo Civil não decorre a imposição ao tribunal da prática de medidas do tipo executivo", nomeadamente o afastamento da Lista A das eleições.
O magistrado defende que "a providência de suspensão de deliberação social não comporta medidas de tipo executivo", ao contrário do que sucede "com outras providências", entre as quais "arresto, arrolamento, restituição provisória de posse".
Na quarta-feira, uma agente de execução tinha citado o Benfica para juntar aos autos da providência cautelar a acta do plenário dos órgãos sociais que decidiu pela demissão em bloco, provocando, assim, a realização de eleições antecipadas, de Outubro para hoje.
Na citação, a solicitadora lembrava o Benfica de que, de acordo com o artigo 397.º, nº3, do Código de Processo Civil, a admissão da Lista A às eleições devia ficar suspensa. (...)"

(Diário de Notícias)

Convinha, mesmo, era alguém ligado ao processo (o magistrado judicial, pro exemplo) prestar esclarecimentos públicos, para bem da compreensão do que está em causa.

Poucas, mas boas medidas

"O diploma aprovado hoje pelo Parlamento consiste num texto apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, com origem num projecto de lei do PS aprovado na generalidade em Março, que entretanto sofreu alterações.
Entre outras alterações, a carência de alimentos e o recurso aos tribunais deixam de ser condições para que alguém em regime de união de facto tenha direito às prestações sociais atribuídas em caso de morte do outro elemento do casal, disse à agência Lusa a deputada do BE Helena Pinto."


(Diário de Notícias)

Nota: gostaria era de saber o porquê de o PSD e o PP terem votado contra...

Offshore da Democracia

João Diogo Stoffel chama a atenção para as recentes declarações de Alberto João Jardim. Escreve ele que "em Portugal, depois deste discurso, a reacção oficial do país é: nenhuma."
Pois... os media deram tanto relevo às declarações do Presidente do Governo Regional da Madeira (só aqui e aqui é que se fala sobre o assunto) que só lendo este post é que tomei conhecimento delas...
Então é assim: parece que AJJ defende uma revisão constitucional de forma a que a Madeira passe a ser um estado federado, com constituição própria e novos órgãos.
Ora como presidente do governo regional, AJJ está obrigado a um respeito institucional e a uma postura bem mais ponderada e delicada. Mas, como toda a gente já o sabe, AJJ de ponderado e delicado não tem nada.
Isto para não falar no respeito pela Lei e pela Constituição. Se não o faz, compete ao órgão máximo nacional chamá-lo à atenção: o senhor Presidente da República. O Sr. Silva, como lhe chamou AJJ...

A ler...

Já não é novidade para ninguém

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Eleições, providências cautelares e um grande imbróglio jurídico

Toda a estória é um enorme imbróglio jurídico...
O candidato às eleições do Benfica, Bruno Carvalho, interpôs uma providência cautelar a requerer a suspensão da candidatura do actual presidente, Luís Filipe Vieira, alegando irregularidades na sua candidatura.
O Tribunal emitiu uma decisão que levantou uma enorme polémica e troca de argumentos e, acima de tudo, muitas dúvidas: foi suspensa a candidatura de Vieira ou não?
Uns dizem que sim, outros dizem que não, e o próprio Conselho Superior de Magistratura veio já hoje dar razão a quem defende o impedimento de Vieira se apresentar às eleições marcadas para amanhã.
Quem também já se pronunciou foi o Dr. Castanheira Barros, com quem concordo: "a partir da citação, e enquanto não for julgado em 1.ª instância o pedido de suspensão, não é lícito à associação ou sociedade executar a deliberação impugnada".
Posto isto, considero que a melhor solução para esta confusão é o adiamento das eleições, até estar judicialmente decidida a questão da candidatura de Vieira.

Não posso, porém, e já no campo desportivo, criticar esta atitude de Bruno Carvalho. Foi com uma marosca jurídica que conseguiu os seus intentos, os quais ainda estamos para descobrir quais são, atendendo ao facto de ser sócio recente e de ter, no passado, elogiado por diversas vezes Pinto da Costa. Questiono-me, até, se a pseudo-candidatura de Moniz não estaria relacionada com esta, nomeadamente quanto aos tão ambicionados direitos televisivos...
O Luís Fialho já tinha aqui deixado bastantes razões para votar em Luís Filipe Vieira, mas toda esta estória deveria fazer pensar todos os benfiquistas - os verdadeiros - e levá-los a votar. E a votar em Vieira, já que considero que, apesar da suspensão judicial da sua candidatura, este poderá concorrer, ficando os resultados suspensos até decisão judicial definitiva. Se, na altura, confirmar-se ser a candidatura irregular, o segundo mais votado sairá vencedor, considerando-se os votos em Vieira como nulos, enquanto que se for dada razão a Vieira, os resultados serão válidos.
Acima de tudo, é preciso serenidade já que, disto tudo, o Benfica sai muito mal visto e fragilizado, algo que deveria ter sido previsto por quem criou este imbróglio.