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No dia seguinte, o caso apareceu nos jornais: “Escândalo abala estado-maior da PJ”, em letras garrafais. “Foi uma ratoeira ao novo director”, diziam uns. “É por ele ser um homem de mão do Ministério Público”, diziam outros. “Só saíram dali quando se aperceberam de que havia fotógrafos e iam aparecer nos jornais!”, comentava-se pelos corredores da polícia. Inicou-se então uma “mega-investigação” policial. Em cinco dias teria de estar tudo esclarecido. Primeiro foi a caça à stripper. A “bomba” que apareceu nas fotografias, cheia de erotismo, afinal só pesava quarenta e cinco quilos e media um metro e meio. A rapariga foi enfiada num carro e sujeita, durante horas, a um interrogatório cerrado. Tinha dezanove anos, trabalhara num hotel onde ganhava pouco e decidira por isso meter-se no striptease. “Pediram-me para actuar, ainda por cima de borla e acabaram por me meter numa confusão destas com a qual não tenho nada a ver…”
Depois, conseguiram apreender um vídeo-amador, onde se viam alguns directores – os tais da mesa de honra -, a aplaudir e a atirar piropos à rapariga, antes da debandada geral. Por fim, interrogaram o organizador da festa, um pacato polícia que estava à beira da reforma. Tinha contratado um ventríloquo, um fadista e a stripper era cereja em cima do bolo. Ainda pensaram em processo disciplinar, mas a coisa ficou por ali.
Viraram-se então para os repórteres. Supostamente, teriam sido os jornalistas que sugeriram à stripper que subisse para cima da mesa dos directores. Porém, uma jornalista – a que publicou as fotos – estampou tudo num editorial. “Não tenho pretensões de imitar os ‘grandes repórteres de investigação’, mas tive a sorte de estar no sítio certo à hora certa. Outros estavam lá e portaram-se muito mal. Houve quem visse, que fotografasse e quem escrevesse que nada se passou. Houve mesmo quem visse e depois insinuasse cobardemente que aquilo que se viu não foi o que se passou. Agora digo eu: houve negociatas e pressões. Alguma comunicação social assustou-se e deixou-se seduzir. Os “bem comportados” vão receber rebuçados. Por isso, atenção políticos: aprestem-se a regularizar os impostos; atenção traficantes de droga: exilem-se para países onde não haja acordos de extradição; atenção adúlteros proeminentes: voltem para as vossas mulheres. É que dentro de poucas semanas vão começar a aparecer notícias que “parecem bem”, notícias escaldantes em alguma comunicação social, fruto do laborioso trabalho de alguns “grandes repórteres de investigação”. Quanto a eles, que eu vejo de queixos enfiados em pratos de lentilhas, desejo-lhes continuação de muito bom apetite.”
O Caso deu-se por encerrado. Mas o editorial é bem revelador da teia de cumplicidades – e tráfico de informação – que existe entre a imprensa, a polícia e o Ministério Público."
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