quinta-feira, 29 de outubro de 2009

O primado do Direito

"O director nacional da Polícia Judiciária (PJ) defendeu hoje que, mesmo em períodos de "crise" e de "grande criminalidade", deve "prevalecer sempre o Direito" e as regras processuais, que asseguram "todas as garantias de defesa".
Almeida Rodrigues falava aos jornalistas no final da apresentação em Lisboa do livro do director da Directoria de Lisboa da PJ José Braz, intitulado "Investigação Criminal - a organização, o método e a prova - Os Desafios da Nova Criminalidade".
"O apelo mais importante que ele faz e com que também me identifico é que, mesmo em alturas de crise e de grande criminalidade, deve prevalecer o Direito", disse Almeida Rodrigues, garantindo que essa é a "tradição" da PJ, que deve ser honrada no dia-dia."

(Lusa)

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Sindicato dos Juízes: fará sentido?

"Tem um percurso histórico paralelo à democracia, tem direito a convocar greve (como aconteceu em 2005) e uma implantação inquestionável - estimada em 95% dos juízes no activo. O que não impede uma crescente contestação à legitimidade da actividade sindical na magistratura. Vários constitucionalistas sustentam que titulares de cargos públicos não devem ceder ao sindicalismo e, para dissipar dúvidas de interpretação, defendem a proibição dessa actividade em sede de revisão constitucional.

"Titulares de cargos públicos têm uma missão incompatível com a prossecução de interesses como os dos outros funcionários públicos", explica Pedro Bacelar de Vasconcelos, professor na Universidade do Minho. "O Presidente da República também tem um vencimento e isso não faz dele um funcionário público como outro qualquer. Se não qualquer dia teríamos um sindicato dos ministros, outro dos deputados..."

Jorge Miranda sustenta que é possível encontrar na Constituição argumentos para vedar aos juízes o direito de organização sindical. Embora a única restrição expressa, no artigo 270º, se refira a militares, agentes militarizados e agentes das forças de segurança, lembra que as restrições não são exaustivas e que devem ser tidos em conta direitos e valores constitucionalmente relevantes. Mas para "tirar dúvidas" nesta interpretação, afirma ao i que se deve "proibir expressamente" a existência de sindicatos de juízes, na próxima revisão constitucional.

Vital Moreira, constitucionalista que em Junho liderou a lista do PS às europeias, concorda com restrições ao sindicalismo judiciário. E na sua opinião as nuances semânticas de designação são pouco relevantes: "Uma associação sindical, como é a dos juízes portugueses, é um sindicato para todos os efeitos. Não penso que haja nenhuma distinção."

Diferente é a opinião de António Martins, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP). "Acredito que estamos a pagar o estigma de termos uma designação sindical", lamenta, salientando que "a forma de actuar é mais importante que a designação". Desde que preside à ASJP, nos últimos três anos e meio, assegura nunca ter utilizado qualquer expressão marcadamente sindical ou a palavra greve. "A generalidade das intervenções da associação tem sido para defender os direitos dos cidadãos e a qualidade da justiça. E é isso que incomoda os poderes instalados."
Considerando que "pegou moda atacar os sindicatos", António Martins recorda que Portugal não está sozinho nesta tradição e que a "Carta Europeia sobre o Estatuto dos Juízes", do Conselho da Europa, recomenda a liberdade de expressão e de associação dos magistrados, sejam judiciais ou do Ministério Público. Espanha, França ou Itália são exemplos de vizinhos europeus com associações de juízes, embora nenhuma com expressão sindical. Nem por isso os juízes espanhóis deixaram de convocar e aderir, este ano, a duas greves.

Certo, admite Nuno Garoupa, professor de Direito na Universidade de Illinois, essa tradição existe na Europa do Sul, mas não na Europa do Norte ou no mundo anglo-saxónico. O sindicalismo surge mais forte "nos sistemas de magistraturas de carreira fechadas, funcionalizadas e burocratizadas como a nossa". Fosse "a presença de juristas de mérito" mais forte e "o sindicalismo seria muito mais fraco", advoga Nuno Garoupa. Que acrescenta outra sentença taxativa: "Onde a justiça funciona bem, não há sindicalismo judiciário."

Haverá, no actual contexto político, condições que potenciam este debate sobre os sindicatos? Provavelmente, ou não seja opinião da ASJP que o último governo foi "campeão a atacar o sindicalismo". Mas a verdade é que as dúvidas não vêm só de fora. O juiz desembargador Rui Rangel foi no passado "defensor incondicional" da ASJP, mas hoje diz "não ao sindicato" e considera que mais cedo ou mais tarde a classe vai fazer este debate.
"Os tempos evoluíram. Hoje há colegas que pensam como eu. Os juízes são titulares de órgãos de soberania e isso coloca questões de princípio muito relevantes." A Associação de Juízes pela Cidadania, a que preside, nasceu para escapar aos limites do sindicalismo e aprofundar a "participação cívica livre"."

(jornal "i")

Ao contrário do que afirma António Martins, a verdade é que a ASJP tem tido, nos últimos tempos, um comportamento puramente sindical e intervenções até políticas. São exemplos disso, o silêncio perante problemas causados por magistrados e intervenções em sua defesa (tal e qual fazem todos os outros sindicatos, sempre falando em direitos e nunca em deveres ou obrigações), por um lado, e a manipulação de um estudo sobre o estado da Justiça e as intervenções em vésperas de eleições legislativas (que levou a muitas críticas, incluindo a de Noronha de Nascimento, presidente do Supremo e do CSM), por outro.
O Dr. Martins bem pode alegar que actua para "defender os direitos dos cidadãos e a qualidade da justiça", mas a verdade desmente-o. Basta ligar os telejornais ou ler os jornais...

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Preocupações

Casos como este (que descobri aqui), que não podem acontecer (não deveriam, num país desenvolvido), é que deveriam preocupar o Dr. António Martins. Se se preocupa tanto com a sua corporação, então deveria preocupar-se com estes casos que apenas dão má imagem à magistratura. E depois não se queixe das sondagens que dão os juízes em último, abaixo, por exemplo, dos políticos...

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Leituras

"O M.P. reivindica em tom carregado que é preciso aumentar os prazos do segredo de justiça. E se começasse por dar o exemplo, passando ele próprio a garantir o cumprimento do segredo? Que legitimidade tem para a reivindicação se diariamente se cometem crimes de violação do segredo - nalguns processos sistematicamente e com claros motivos manipuladores - na total impunidade?"

(Daniel Proença de Carvalho, no Diário Económico de sábado)

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Pirataria informática

"A Polícia Judiciária (PJ) apreendeu quinta-feira, em quatro residências e uma empresa de Lisboa, dispositivos electrónicos, dados informáticos e software de cifra e encriptação, e constituiu dois arguidos.
Em comunicado hoje divulgado, a PJ refere que a investigação em curso teve por base notícias sobre fragilidades de segurança em redes informáticas do Estado e o relatório de uma empresa que fazia referência à obtenção e posse de informação sensível de diversos organismos, entre os quais o Ministério da Justiça, e empresas privadas.
A operação "Ghostbuster" pretendia "recolher elementos probatórios da eventual prática organizada de crimes informáticos de natureza transnacional, designadamente acesso ilegítimo, acesso indevido e dano informático, tendo sido constituídos dois arguidos, que cooperaram com a acção da justiça".
A operação policial teve a intervenção do juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de investigação Criminal e do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), que emitiram as competentes ordens judiciais, visando não só a preservação da prova como também a neutralização imediata dos meios que permitiriam a continuação da actividade criminosa.
É considerado crime, punido com prisão, "qualquer acto de pretenso ou eventual teste de segurança sem consentimento expresso dos titulares e proprietários dos sistemas e das redes informáticas visadas"."

(Diário de Notícias)

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Alberto Martins

Troca de Alberto's na pasta da Justiça, sai Costa e entra Martins, antigo líder parlamentar do PS.
Acredito que será melhor do que Alberto Costa (pior será quase impossível), mas penso que o nome fica aquém das expectativas.
Um Ministro da Justiça, uma das pastas mais delicadas e mais exigentes (a Justiça é um dos pilares da Democracia) deve ser alguém ligado ao sector, com conhecimento pessoal dos problemas da Justiça, alguém com passado conhecido (e reconhecido) na área.
Desde Laborinho Lúcio (agora Juíz Conselheiro) que não temos um Ministro da Justiça cujo nome tenha algum peso no sector (Aguiar Branco mostrou ser um flop, apesar de ser advogado). E considero que este aspecto torna-se, como se tem tornado até aqui, num handicap do titular da pasta.
Espero, pois, um Ministro um pouco mais certeiro nas medidas, mas ficará à margem das necessidades da pasta e das alterações que se exigem no sector. Espero, claro, é estar enganado...

A piadola de Pinto Monteiro

E justifica: "Desde logo o julgamento antecipado pela imprensa que é muitas vezes definitivo dada a diferença entre o tempo da Justiça e o da comunicação social. Depois há que ter em conta a possível influência da imprensa sobre a investigação e o julgamento. Até que ponto as buscas, a prisão preventiva e a própria decisão não são directa ou indirectamente influenciadas pela comunicação social", questionou o PGR, sublinhando que esta questão não está ainda "suficientemente estudada e apurada"."
Pinto Monteiro tem toda a razão, mas não deixa de ser uma piadola, ainda por cima de mau gosto, vinda de quem vem...

Quase todos os dias existem fugas de informação de processos sob segredo, que consubstanciam crimes de violação de segredo de justiça e o Ministério Público, liderado pelo próprio Pinto Monteiro, nada faz. Quer dizer... até faz alguma coisa: acusa os coitados dos mensageiros dos jornalistas. Enquanto isso, os chibos continuam lá, a ter acesso à informação e a chibarem-se cá para fora, sabendo muito bem quais os efeitos da publicação da informação que passam aos jornalistas...
Se Pinto Monteiro é sério - e nada me faz querer que não o seja - então deveria dizer, também, que quem viola o segredo de justiça está a cometer mais do que um mero crime. Está, igualmente, a criar prejuízos sérios em pessoas presumivelmente inocentes, a cidadãos que são prejudicados - sobretudo politicamente - sem serem condenados por nada. É condenar alguém a sanções graves sem terem apresentado ainda defesa e sem serem, sequer, julgadas!

Mas há aqui um outro ponto, que é suscitado pelo PGR: a possibilidade de as notícias pressionarem os juízes a decidirem em determinado sentido, pela culpabilidade dos arguidos, portanto...
Ainda esta semana tive um debate instrutório de um mega-processo. Muitos arguidos, muitos advogados, muitas testemunhas, um caso altamente complexo e extenso. Um caso que até já foi falado na comunicação social. Uma das notícias, que descobri, por mero acaso, num jornal que de vez em quando compro, fazia um excelente resumo da acusação. A acusação tem largas centenas de páginas, mas o jornal, numa página, faz um resumo, deveras completo e objectivo, fazendo até referência a escutas (sobre as quais foram levantadas no processo dúvidas sobre a sua legitimidade). Pergunto. a quem aproveita a publicação do caso e de toda aquela informação? Não ficarão os juízes de julgamento condicionados a esta notícia? Que imagem poderão passar os juízes à opinião pública, que já fez o seu julgamento e ficou, com a notícia, convicta da culpabilidade dos arguidos? Não terão os juízes medo de absolverem os arguidos, quando a opinião pública considera-os culpados depois de terem lido a notícia? A quem aproveita a notícia? Quem beneficia com a fuga de informação?

Quem costuma ler-me, sabe que tenho sido extremamente crítico em relação a esta situação. Chegámos a um ponto em que mais parece que mais vale deixar de punir a violação do segredo de justiça, revogar o artigo 371º do Código Penal, pois fica a sensação de que é isto que o MP pretende. Se o MP e Pinto Monteiro querem mesmo um combate à violação do segredo de justiça, então começem por averiguar quem se chibou, desde logo por quem tem acesso aos processos, pois enquanto continuarem sem fazer nada a este respeito, MP e Pinto Monteiro são moralmente cúmplices dos crimes...

Magistratura judicial

Pegando nos comentários do Bastonário da OA no Prós & Contras de segunda-feira, Valupi considera que existe uma "monarquia judicial", que promove ou acentua a "soberba" com a qual os juízes pecam. Na minha opinião, tal não corresponde à verdade.
Valupi começa, aliás, por referir-se à juventude de alguns magistrados, que "aos 27 anos podem estar a exercer um poder absoluto sobre terceiros e nas matérias ética e antropologicamente mais complexas e melindrosas."
Se uma jovem adulto de 27 anos pode ter alguma imaturidade - e este pressuposto aplica-se a todas as profissões - também pode ter, por exemplo, uma nova mentalidade, mais aberta e menos conservadora. Ao contrário do Valupi, considero que os novos magistrados, recém-formados, saíem do CEJ com outra preparação, melhor formados para a sociedade do Séc. XXI, ao contrário dos magistrados já em fim de carreira (quase todos nos tribunais superiores), que foram formados antes do 25 de Abril e numa sociedade de mentalidade muito diferente da actual.
Se a idade traz mais experiência, maturidade e sabedoria, a juventude pode trazer um conhecimento mais actual, mais consentâneo com a realidade e os problemas de hoje.

Da minha experiência, retiro precisamente esta conclusão. Os magistrados mais novos são os que menos mostram "traços de soberba" (expressão do Valupi), mostram mais atenção para as pessoas e menos se colocam numa posição de "donos e senhores" dos tribunais. Devem ser os operadores judiciais (juízes, magistrados do MP, advogados, funcionários judiciais, etc) a servirem a Justiça, as pessoas, e não o inverso. E considero, pelo que vejo quase todos os dias, que os mais novos são os que mais vêm a Justiça como estando ao serviço das pessoas e não estas que servem a Justiça.

Em conclusão, posso dizer que até estou, ao contrário do Val, optimista em relação ao futuro, pois vejo os magistrados mais jovens - que, note-se, não deixam de estar preparados para exercerem as funções - a lidarem com a Justiça como um bem precioso e um direito de todos, a respeitarem as pessoas, a, por exemplo, falarem com as pessoas para explicar o porquê do atraso no julgamento ou na necessidade de terem de voltar ao tribunal noutro dia, em vez dos mais experientes, que, por exemplo, começam o julgamento com mais de uma hora de atraso sem darem qualquer justificação ou pedirem desculpa a todas as pessoas que esperaram por eles...
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Adenda: ainda esta semana, houve um julgamento que acabou por não se realizar e em que a Juíz chamou as testemunhas à sala para, em conjunto, agendarem, de acordo com a disponibilidade decada um, uma data para a realização do julgamento. Esta situação é, infelizmente, rara, pois a larga maioria limita-se a marcar a nova data e se alguém não puder, paciência...

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Sindicalismo da magistratura judicial: que futuro?

Noronha de Nascimento deu o mote:

António Martins respondeu, entretanto, na mesma moeda:


Como já aqui escrevi, o "caso Rui Teixeira" foi manipulado por várias pessoas, pois foi dado a entender que tinha sido proposta a suspensão da nota ao magistrado por três vogais indicados pelo PS quando, na realidade, foi proposta por Laborinho Lúcio, ex-Ministro e indicado por Cavaco Silva...
Também o Juíz Desembargador Eurico dos Reis e o ex-vogal do CSM Luís Máximo dos Santos criticaram a ASJP e a sua postura nesta matéria.
A verdade é que a ASJP tem-se comportado, cada vez mais, como um verdadeiros sindicato, tudo fazendo para proteger os seus associados, mais parecendo aqueles sindicatos que estão sempre contra tudo, em vez de entidade representante dos titulares de um órgão de soberania, o que só prejudica a imagem e desprestigia a magistratura judicial portuguesa. O Dr. António Martins deveria reflectir nisto, pois não sou só eu que o digo...

domingo, 18 de outubro de 2009

João Tiago Silveira

Novo Ministro da Justiça?

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Momento lúdico

Idade da pedra

Por diversas vezes, os magistrados, judiciais e do Ministério Público (parece que é à vez), vieram a público criticar o Citius e exigir a suspensão do programa, alegando insegurança do sistema e atrasos nos processos.
Sobre este tema já me pronunciei aqui a semana passada. Mas, como anteontem foi o SMMP a voltar à carga, queria, agora, acrescentar alguns pontos:

1. António Martins, Juíz-Conselheiro e presidente da Associação Sindical dos Juízes, afirmou que o Citius atrasa os processos. Gostava de saber que juízes se queixam de atrasos provocados pelo Citius, já que o que tenho ouvido é que os juízes despacham mais rápido e estão contentes com o programa informático. Por exemplo, ainda este mês a revista da Ordem dos Advogados traz uma reportagem sobre as novas tecnologias na Justiça, onde o Juíz Paulo Correia (Varas Mistas do Tribunal de Coimbra) elogia o Citius, afirmando ser "uma medida claramente positiva" e defendendo o seu alargamento aos processos-crime (pág. 29 do Boletim da OA nº 57).

2. O Sindicato do MP voltou, anteontem, a exigir a suspensão do Citius. Mas agora vai mais longe, exige a suspensão não só do Citius, mas de todos os sistemas informáticos da Justiça, invocando a sua insegurança!
Quanto à segurança dos sistemas informáticos, remeto a minha opinião para este post: não há nenhum sistema informático (e-mail, site, software, rede, etc) do Mundo totalmente seguro. Parece que o SMMP sofre da mesma doença da Presidência da República...
Curioso é que, também na Revista da OA, pode ler-se a opinião de um magistrado do MP (José Trindade) sobre o Citius, que confessa utilizá-lo para despacho diário e ser um adepto da ferramenta.
Seria bom, pois, saber se o Sindicato fala em nome de todos os procuradores, de alguns ou apenas em nome do próprio Sindicato...

3. Ao exigir a suspensão de todos os sistemas informáticos da Justiça, o SMMP está a exigir que voltemos à idade da pedra. Não é so o Citius que está em causa, mas também o Habilus, os e-mails dos vários organismos, dos sites que permitem, por exemplo, a emissão de certidões ou registos online, de um Mundo inteiro que funciona à base das novas tecnologias.
O SMMP pede a suspensão das tecnologias por estas não serem seguras. Acabemos, portanto, com os e-mails, pois podem ler os e-mails, acabemos com os sites, pois os hackers podem lá entrar e ter conhecimento da informação e de dados, acabemos com as certidões online, pois os piratas informáticos podem alterar o teor das mesmas, enfim, acabemos com tudo, pois nada é seguro. Se quiser pedir uma certidão, por exemplo, de nascimento, não peço através do site do IRN, pois pode alguém aceder à informação e saber em que dia nasci. O melhor é passar uma manhã inteira num balcão para pedir uma folha... Se quiser enviar um requerimento para um Tribunal, deixo de enviar pelo Citius, pois não é seguro. Por e-mail também não, pois alguém pode ler. Envio por correio, indo para a fila dos CTT. Bem... pensando melhor... é melhor não, alguém pode abir a minha carta (já houve funcionários dos CTT apanhados a abrir correspondência...). O melhor mesmo é apanhar o Metro para ir à Secretaria entregar pessoalmente. Isto se um carteirista não me abrir a pasta e ler o requerimento...

Esta posição, para além de absurda, é totalmente irrealista e radical. Só mesmo um sindicalismo puro e duro é que pode justificar este extremar de posições por parte de quem se arroga exercer funções de soberania.
Triste Justiça a nossa...

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O relatório do Observatório Permanente de Justiça

Foi hoje conhecido o relatório do Observatório Permanente da Justiça, que pugna por algumas alterações ao Código de Processo Penal.
Para além das medidas positivas, que constituiem a maioria, são apontados quatro pontos em que a reforma de 2007 falhou: alteração ao regime de segredo de justiça no que respeita ao impacto no combate à criminalidade grave e complexa, detenção fora de flagrante delito, prisão preventiva e medidas que pretendiam conferir ao sistema de justiça penal mais eficiência.
Analisemos, então, as propostas de alteração indicadas no relatório (págs. 26 a 39):

1. Alargamento dos prazos de Inquérito

O Observatório concorda com os actuais limites máximos, que considera adequados, mas defende, porém, a possibilidade de alargamento nos casos de grave e complexa criminalidade.
Concordo com esta proposta, mas com a condição de que o alargamento do prazo deve ser concedido pelo Juíz de Instrução Criminal, a requerimento fundamentado do Ministério Público, pois não pode ficar nas mãos do MP a decisão de alargar os prazos dada a tentação para decretar "especial complexidade" em muitos casos que não o são e apenas para ter mais tempo.

2. Segredo de Justiça

É defendido o alargamento do prazo da manutenção do segredo de justiça (e consequente adiamento do acesso do Arguido aos autos), nos mesmos termos do alargamento do prazo máximo de Inquérito e para os mesmos casos - crimes graves e de especial complexidade.
Concordo, pois, tratando-se de crimes especialmente complexos (criminalidade altamente organizada, por exemplo) há que equilibrar o direito do arguido a ver o seu processo concluído em prazo razoável e o direito à investigação que se encontra, nestes casos, desquilibrado em desfavor da investigação.

3. Detenção fora de flagrante delito

O Observatório defende a possibilidade de detenção fora de flagrante delito nos casos "em que haja perigo eminente da continuação da actividade criminosa".
Aqui já tenho sérias dúvidas, pois, para além de serem casos que se verificam em reduzidíssimo número (os crimes de violência doméstica e os previstos na Lei das Armas já prevêm esta possibilidade), não me parece proporcional. O Observatório fala nos casos em que alguém está prestes a cometer um crime... Peguemos, então, neste exemplo: um indivíduo tem uma faca na mão e dirige-se a outro, dando a entender que o vai matar. Um agente policial antecipa-se e evita o crime. Poderá detê-lo? Sim, mas porque apanhou o indivíduo, em flagrante, a praticar um crime de homicídio na forma tentada. Este caso não se aplica, portanto, ao exemplo dado pelo Observatório. Ou seja, aqueles casos em que não há flagrante - porque é disto que se trata, fora de flagrante delito - devem permanecer inalteráveis, sob pena de abrir uma janela legal a eventuais abusos.

4. Prisão preventiva

Com a reforma de 2007, o furto qualificado deixou de possibilitar a prisão preventiva. Este foi um dos principais erros apontados à alteração do CPP e o Observatório prevê o alargamento da possibilidade de aplicação da prisão preventiva a crimes com pena máxima igual ou inferior a 5 anos de prisão.
São apontadas duas soluções possíveis: voltar ao regime antigo, ou seja, estabelecer a possibilidade de aplicar a prisão preventiva a todos os crimes com pena máxima superior a 3 anos (e não 5), ou alargar o catálogo da al. b) do nº 1 do art.º 202º do CPP, nomeadamente para o furto qualificado.
O Observatório defende a segunda solução, posição essa que subscrevo. Se o furto qualificado pode ser, em abstracto, merecedor de prisão preventiva, já outros crimes, com pena máxima não superior a 5 anos, que já não devem contemplar a medida de coacção mais gravosa.

5. Processo sumário

Esta forma de processo, mais célere, que deve ser empregue nos crimes menos graves e nos casos em que haja flagrante delito, tem sido muito pouco utilizada, ao contrário do que se esperava com a reforma de 2007. O Observatório defende que possa ser alargado o prazo para a realização do julgamento de 48 horas para 15 dias. Actualmente, se não for presente a Tribunal para julgamento em processo sumário, o arguido era libertado (no caso de estar detido) e o processo transitava para processo comum, muito mais moroso, portanto...
Note-se que, caso assim seja requerido pelo Arguido, o julgamento pode ser adiado até ao máximo de 30 dias, de forma a preparar a defesa. Não espantará ninguém, pois, que seja concedida a mesma prorrogativa ao MP, para recolher mais provas, em especial as periciais, que levam, como se sabe, algum tempo.

6. Violação do dever de segredo de justiça

Nesta matéria, o Observatório não apresenta conclusões, por entender que não existem dados, nomeadamente estatísticas relativas aos processos e às condenações por violação de segredo de justiça, suficientes para indicar o que está bem e o que está mal. Todavia, uma das medidas propostas para combater as fugas de informação é a definição de procedimento rígidos que permitam que os processos em segredo sejam efectivamente guardados e que estabeleçam quem tem acesso ao processo e onde deve ser guardado, de modo a poder identificar os responsáveis pelas fugas de informação.
Quem me costuma ler, sabe que tenho sido extremamente crítico no campo da violação de segredo de justiça. E sabe qual é a minha opinião sobre as fugas e sobre a passividade das autoridades competentes para investigar estes casos... Considero, antes de mais, que é uma questão de mentalidade, que mina a vontade de investigar, e de hábitos. Espero que com o tempo as coisas mudem, mas duvido, pois, com a actual mentalidade da Justiça e dos operadores judiciais, não vejo como será possível alterar velhos hábitos e velhos tiques...

domingo, 11 de outubro de 2009

Espionagem na rede informática do Ministério da Justiça?

"São dados preocupantes: elementos relativos à segurança informática do Ministério da Justiça (MJ) podem ter sido roubados por piratas informáticos chineses. Quem o afirma são dois peritos informáticos portugueses, que mostraram a dois jornalistas do DN o resultado da sua investigação à rede de espionagem Ghostnet: logins e palavras-passe de acesso aos sistemas, códigos para acesso remoto aos computadores, e-mails trocados com o Ministério Público, identificação e códigos de acesso aos sistemas informáticos das direcções dos Registos e do Notariado e do Registo Civil, dados técnicos da firewall da Polícia Judiciária e pastas pessoais (não abertas) de técnicos do MJ.
"Com esta informação, consegue-se fazer tudo", disse Bruno Vieira, um dos autores da investigação, que apenas deixou o DN observar os dados. "Apenas os entregaremos às autoridades", garantiu. (...)
A investigação levada a cabo por Bruno Vieira e Luís Rodrigues decorreu durante seis meses até conseguirem entrar nos servidores alojados na ilha de Hainan, na China. Depois, segundo explicaram os próprios, "fizemos um levantamento de IP registados em Portugal, separando as entidades privadas das públicas". "O nosso objectivo foi perceber que informação foi retirada de organismos públicos." Ainda assim, tal como escreveram no relatório, encontraram indícios de que empresas como a PT, a Brisa e a EDP também foram alvo de ataques cibernéticos.
Confrontado com os resultados da investigação dos dois portugueses, assim como com os dados que o DN observou, o MJ, através do Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça (ITIJ), não abordou directamente os elementos recolhidos. Preferiu associar a divulgação do relatório da Trusted a uma "estratégia de promoção comercial e publicitária da empresa responsável pelo mesmo, uma vez que se trata de uma empresa recente, com o capital social mínimo, pouco conhecida no mercado e que, aparentemente, vende serviços de segurança informática". O ITIJ diz ainda que vai entregar o relatório às "autoridades competentes para efeitos da investigação criminal e apuramento da responsabilidade criminal a que possa haver lugar".
Não desmentindo que o MJ foi alvo da Ghostnet, o ITIJ considerou que a forma como os autores da investigação a divulgaram "demonstra leviandade e pretende criar um clima de alarmismo, pois estão em causa questões que devem ser abordadas de forma séria, credível e responsável"."

(Diário de Notícias)

A piadola de Pinto Monteiro

"PGR diz que "não há inocentes" na violação do segredo de justiça"
Apesar de preocupante e exemplificativo do actual estado da nossa Justiça, não deixa de ser engraçado que o Procurador-Geral da República, figura máxima da entidade responsável pela acção penal em Portugal (Ministério Público), venha dizer que na violação do segredo de Justiça não haja inocentes, pois, até agora, ainda não houve culpados, senão os coitados dos mensageiros dos jornalistas, que se limitam a publicar as informações que lhes são dadas pelos "chibos" e verdadeiros autores dos crimes.
Se ainda tivesse vindo dizer que foram abertos processos crimes contra procuradores, contra juízes, contra funcionários judiciais, contra advogados, enfim... contra as senhoras da limpeza, para averiguar quem se chibou à Comunicação Social, teria sido levado a sério, mas como nada disto foi feito, Pinto Monteiro limita-se a passar uma imagem igual á do político que, em campanha eleitoral, promete medidas, medidas essas que nunca aplicou durante o mandato...

Leituras

1. "(...) A ASJP tinha demasiados tiques sindicalistas. Porém, nunca me passou pela cabeça que essa organização se viria a tornar - como se tornou e já há muito - num sindicato em que os membros da sua direcção agem como se sentissem inveja daqueles que dirigem os sindicatos dos professores. Ou o dos procuradores do Ministério Público.
Todavia, a direcção da ASJP atingiu um novo recorde com o comunicado em que afirma que os juízes (e eles não falam em nome de todos os juízes - por exemplo, em meu nome não falam) perderam a confiança no CSM. E, o que é pior, fizeram as suas críticas num momento que cria legítimas suspeitas quanto aos verdadeiros objectivos da sua actuação; porque razão a "notícia" de um facto ocorrido em Julho surgiu em plena campanha eleitoral?
Os juízes, homens e mulheres como os outros, exactamente porque são seres humanos, têm ideologias e até afinidades ideológicas; o que não podem ter - nunca por nunca - é enfeudamentos partidários. Ou parecer que os têm. (...)
Na verdade é conveniente não esquecer que, mal ou bem, em duas decisões judiciais (sendo totalmente irrelevante que numa delas tenha sido aposto um voto de vencido), foi entendido que o juiz em causa cometeu um erro grosseiro. E relativamente a uma dessas decisões (que condenou o Estado a pagar uma indemnização - sendo certo que a nova Lei da Responsabilidade Civil Extra-contratual do Estado não se aplica a este caso) está ainda pendente um recurso no Tribunal da Relação de Lisboa. Se essa decisão for confirmada, pese embora não seja possível, ainda que assim seja, o exercício do direito de regresso por parte do Estado, que imagem daria de si a Judicatura se tivesse graduado esse Juiz com a notação máxima (Muito Bom)? E não será eventualmente mais tranquila a decisão se a sentença for revogada?
Finalmente é falso e até injurioso afirmar que se está a procurar intimidar os juízes - pois não foram alguns políticos condenados sem que sobre os julgadores tenha recaído qualquer crítica? Para além disso, se o CSM tivesse apreciado o relatório de inspecção, fosse qual fosse a decisão tomada, não poderia ela ser entendida como uma pressão sobre dois processos pendentes, aquele que corresponde ao recurso na Relação e o outro o "eterno" caso da Casa Pia?
O CSM agiu sensatamente. (...)"

(Juíz Desembargador Eurico Reis, ontem no "i")


2. "A posição da ASJP [Associação Sindical dos Juízes Portugueses] sobre a deliberação do CSM [Conselho Superior da Magistratura] que suspendeu a actualização da classificação de serviço do juiz Rui Teixeira até ser conhecida a decisão final do processo que condenou o Estado português ao pagamento de uma indemnização, por erro grosseiro imputados àquele magistrado, evidenciou o mar de equívocos em que o sindicalismo judiciário tem vivido. Tais equívocos não devem passar em claro, pois prejudicam a saúde do nosso Estado de Direito e, paradoxalmente, os próprios magistrados que se diz pretender defender. (…)
A discussão do modelo de avaliação dos juízes, incluindo a questão nuclear da selecção dos inspectores, é necessária e deve ter o contributo da ASJP. Já a atribuição concreta de uma classificação de serviço não é nem pode ser uma questão sindical. O mais elementar bom senso — essa qualidade tão importante nos juízes — impunha que esta matéria ficasse na sua sede própria: o CSM e os tribunais. Em plena campanha eleitoral, a ASJP não hesitou em colocar no terreno político uma questão que lhe é estranha, sintomaticamente logo aproveitada pelo principal partido da oposição, numa objectiva aliança político-partidária. Preocupada com os próximos actos no interior da magistratura, a ASJP sacrificou princípios fundamentais à luta pelo poder no seio da classe, imitando afinal os piores tiques dos tão criticados “políticos”. (…)
É estranho que a ASJP não tenha ponderado, sequer, a eventualidade de se justificar alguma prudência em subir para a notação máxima a classificação de serviço de um juiz que o sistema judicial — através de tribunais livres e independentes — considerou ter cometido erros grosseiros no exercício da profissão, ignorando a necessidade de a avaliação dos magistrados cumprir critérios de justiça relativa. Finalmente, não receia a ASJP que a sua tomada de posição seja interpretada como uma objectiva forma de pressão sobre os magistrados que irão ainda intervir neste processo?"

(Luis Máximo dos Santos, ex-vogal do CSM, no Diário de Notícias de ontem)

sábado, 10 de outubro de 2009

Triste Justiça a nossa...

Está abertamente declarada a guerra dos Magistrados ao Citius.
Em Julho, quer a Associação Sindical dos Juízes, quer o Sindicato dos Magistrados do MP, declararam estar contra o programa informático. António Martins, presidente da ASJP, acusou o programa de atrasar os processos, defendendo a suspensão da utilização do Citius até se resolverem os problemas. Depois foi João Palma, recentemente eleito representante sindical dos Magistrados do MP, a levantar a questão da segurança do programa. A esta suspeição, respondeu o Ministério da Justiça, defendendo que o programa é seguro. Pelo meio, ainda houve um pedido ao Tribunal Constitucional, que se pronunciou pela constitucionalidade do programa. Agora, em Outubro, é António Martins que volta à carga: há processos que desaparecem do Citius.

Quanto à questão da celeridade, António Martins não tem razão. E os estudos provam isso. Mais. Eu bem sei que representa os juízes, mas limita-se a tentar proteger os seus direitos, mas não fala nos deveres. Ainda esta semana tive um julgamento agendado para as 9:15. Porém, a primeira chamada foi feita às 9:25, a segunda às 9:35, às 9:40 quer eu quer o arguido estávamos na sala de audiências, bem como os restantes advogados e arguidos dos restantes processos. Às 10:15, lá entrou a Juiz Presidente com a Procuradora do MP, para a leitura de um Acórdão, às 10:25, entraram os restantes Juízes, para formar o Colectivo e, como a testemunha faltou, ficou despachado o processo. Lá saíu um dos juízes, para ser substituído por outro, para formar o Colectivo do meu processo. Eram 10:30 quando se inicou o meu julgamento, 1 hora e 15 minutos depois da hora. Ah, e o Tribunal (Juízes) não pediu desculpa a ninguém!
Estes casos, que se repetem quase diariamente, é que deveriam preocupar o Dr. António Martins.

Quanto ao Citius, é um programa informático como tantos outros. Tem defeitos e não é perfeito, podendo e devendo ser melhorado. Mas pergunto: quantas vezes estamos, por exemplo, a escrever um texto no Word e, sem querer, carregamos numa tecla e o texto desaparece todo? Será isso culpa do Word ou da Microsoft? Será que exigimos ao Bill Gates que suspenda a comercialização do programa até se corrigirem os problemas?

Não conheço um advogado deste país que seja contra o Citius. Sem dúvida que tem defeitos, mas as vantagens são inúmeras e quem ganha é a Justiça. Eu bem compreendo que somos um país de Velhos do Restelo, conservadores, alérgicos à mudança, sobretudo a radical. Mas há que olhar para o futuro e não ficar parado no Tempo, como pretendem, neste caso, os magistrados.

Marinho Pinto nos Gato Fedorento

Aqui.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Quiz: quantos crimes foram praticados?

E deixo uma sugestão ao PND: se as autoridades policiais não cumprem a Lei, podem sempre deduzir acções contra a PSP. Talvz quando começarem a perceber que serão eles a pagar pelos erros do Alberto João, passem a cumprir e a fazer cumprir a Lei e a Constituição...

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A vergonha da Justiça portuguesa

Já aqui me pronunciei por diversas vezes sobre a constante violação do segredo de justiça. Não vou, pois, repetir-me. Mas a verdade é que esta impunidade que protege os verdadeiros autores deste crime é a maior vergonha da nossa Justiça.
Começou hoje o julgamento de 20 jornalistas no Tribunal de Oeiras, acusados do crime de violação do segredo de justiça, referente ao processo "Casa Pia". São acusados, portanto, de publicarem notícias revelando dados constantes do processo (nomeadamente escutas telefónicas), dados esses que estavam abrangidos pelo segredo.
Mas o mais curioso é que, segundo o Expresso, uma das notícias revelou uma transcrição (de escutas) realizada pelo procurador João Guerra. Ou seja, sabe-se quem tinha acesso à informação, mas não se investiga como esta chegou aos jornalistas. Será que arrombaram o gabinete do procurador, pela calada da noite, copiando a transcrição? Ou será que andaram a "escutar" ou a ler os e-mails do Dr. João Guerra (como insinuaria um certo chefe de estado)? Ou será que foi a senhora da limpeza, que leu, copiou e deu aos jornalistas?
Esta é a maior vergonha da Justiça portuguesa e o nosso Ministério Público mostra uma atitude incrivelmente passiva. Não investiga a fonte das fugas, os "chibos", mas vai atrás do mensageiro, dos jornalistas que publicam as matérias que chegam ao seu conhecimento. Será que os procuradores têm medo de investigar colegas e magistrados juízes?

(foto)


Adenda: amanhã farei uma análise ao artigo 371.º do Código Penal (crime de violação de segredo de justiça) e a sua aplicabilidade aos jornalistas que "se limitam" a publicar a informação.

Processo-crime contra Procurador do DIAP

"(...) A Almeida Pereira, magistrado histórico do DIAP do Porto, não bastava ter sido suspenso um ano e meio sem direito a vencimento: a PGR solicitou a instauração de um processo-crime contra ele. Em causa está a eventual prática dos crimes de denegação de justiça e prevaricação - puníveis com dois anos de prisão, ou cinco, se ficar provado que foram cometidos com intenção de prejudicar ou beneficiar alguém - o que não terá sido o caso, de acordo com o relator do processo disciplinar instaurado pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).
A informação foi confirmada pela PGR que acrescenta ter solicitado a abertura de mais um processo disciplinar contra o procurador que já foi número dois do DIAP do Porto e chegou a ser convidado para dirigir a PJ local - só não aceitou por causa da oposição de Pinto Monteiro. (...)"

(Expresso)

Vale a pena, também, comparar este processo com este caso. Para reflectir...

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Marinho Pinto dixit

Excertos da entrevista do Bastonário da OA ao "i":


"(...) Propôs também alterações no exercício da advocacia por deputados. Porquê?
Um advogado que vá para o governo, para presidente da Câmara ou para director-geral suspende a advocacia. Um deputado que vá para o Parlamento por maioria de razão deve suspender, porque vai fazer leis que podem ser do interesse directo de alguns dos seus clientes.

Acha que um diploma nesse sentido será aprovado na Assembleia, onde muitos deputados estão nessas condições?
Acho. Se os deputados o não quiserem fazer, assumam as suas responsabilidades. Eu não actuo de acordo com o êxito das coisas, mas de acordo com a minha consciência, com valores e princípios. Perdi muitas batalhas na minha vida. Esta poderá ser ganha ou perdida. Se for perdida, atrasa uma reforma que é inevitável. Em Espanha os deputados são em dedicação exclusiva. Funções de soberania não podem ser exercidas em part time e não é legítimo arredondar os vencimentos dessa função com actividades privadas que possam estar em conflito.

Têm sido mais frequentes buscas a escritórios de advogados. Há uma mudança de atitude do poder judicial com os advogados?
A facilidade e a leviandade com que os magistrados fazem buscas em Portugal aos escritórios de advogados é aterradora. Isto levanta as piores suspeitas. Um advogado deve ser alvo de buscas quando participa na prática de um crime. Aí deve responder como qualquer cidadão. Agora a um advogado que auxilia uma pessoa suspeita de um crime a defender-se em juízo, devem respeitar-se as imunidades. Não pode vasculhar-se a correspondência com o seu cliente. Não pode fazer-se escutas. Isto é um princípio sagrado em qualquer democracia. As piores ditaduras é que actuam como estão a actuar os magistrados hoje em Portugal. Isto era o que fazia a PIDE antes do 25 de Abril. Com este fundamentalismo justiceiro, qualquer dia estão a colocar microfones nos confessionários, porque para estes arautos vale tudo para investigação criminal.

Mas não são suficientes as garantias legais? As buscas a advogados são rodeadas de requisitos e acompanhadas.
Não há garantias, porque mesmo quando os documentos são selados tudo depende depois da apreciação que uma pessoa fizer, neste caso o presidente da Relação. Quando a lei devia ser clara. Se um advogado é suspeito, constituam-no arguido e façam buscas ao escritório e a casa. Não havendo indícios, vão lá para quê? Normalmente isto acontece quando se investiga para a comunicação social. Tem de se apresentar resultados e manchetes. Não foi por acaso que quando os investigadores chegaram à sociedade Vieira de Almeida [na semana passada], os jornalistas já lá estavam. Os investigadores deviam esclarecer rapidamente quem convidou os jornalistas. Isto é vedetismo mediático de alguns magistrados. (...)

Não tem fé na justiça?
Tenho muita desconfiança nos processos que nascem nos jornais. Isso é espectáculo, não é investigação. Não conduz a nada. Transmite a ideia de que estão a fazer, mas não estão a fazer nada de útil contra a criminalidade. Hoje a investigação criminal está mediatizada em Portugal.

E de quem é a responsabilidade? Da comunicação social?
Não, a comunicação social cumpre o seu papel. Mal, mas vai cumprindo e eu prefiro a comunicação social assim do que calada. É de quem tinha responsabilidade de fazer respeitar o segredo de justiça e não faz. (...)

Está em formação um novo governo. Quem seria o ministro da justiça ideal?
Em Portugal quem tem a pasta da Justiça é um ministro de papel, de palha. Não manda nada. Os procuradores são independentes, fazem o que querem; os juízes são independentes, fazem o que querem. As políticas de justiça não são definidas pelo ministro, são executadas por ele em parte muito pequena. Deviam ser mais definidas no Parlamento e pelo governo, mas têm sido definidas em função dos interesses dos agentes da justiça. O ministro ideal era aquele que aparecesse a executar políticas dirigidas aos interesses dos cidadãos e empresas.

O governo já anunciou correcções à reforma penal. Considera que são necessárias?
A reforma penal foi positiva e nos aspectos em que não funcionou bem foi por ser sabotada por parte de alguns sectores das magistraturas. Se a lei estabelece prazos para as partes e os advogados cumprirem e perdem os seus direitos se não os cumprirem, os magistrados que não cumprem deveriam ser punidos ou pelo menos averiguadas as razões pelas quais não cumpriram. A lei é draconiana para as pessoas e para os magistrados é o que eles quiserem, porque eles é que a interpretam. A reforma penal tentou incutir um espírito de maior responsabilidade, mas os magistrados querem ter todo o tempo do mundo.

Depois do seu artigo na Ordem, sobre o início do processo Freeport, sente que ficou mais conotado com José Sócrates?
Nunca fui do Partido Socialista e não devo rigorosamente nada ao PS.

Mas em processos mediáticos como este qualquer tomada de posição não tem esse risco de ser lida politicamente?
Eu guio-me pela minha consciência e não pelas opiniões dos outros sobre mim. Por isso se calhar é que sou polémico. Eu fui visitar à cadeia, quando estava em prisão preventiva, o líder de extrema-direita acusado de racismo. Também pode dizer que sou apoiante do partido dele. Não me importo. Esse tipo de coisas não me desmobiliza. Aquele artigo foi uma denúncia, com factos, sobre o nascimento de um processo que deveria envergonhar a justiça portuguesa e que está aí, há vários anos, unicamente com uma função: tentar dificultar a vida a um dirigente partidário. Com base numa carta sem um único facto o Ministério Público abriu um processo para fritar em lume brando um dirigente partidário.

O Ministério Público agiu por razões instrumentais?
O Ministério Público há muitos anos está em guerra civil com o próprio Estado e com todos os governos. Desde que não lhes aumentem os privilégios, estão em guerra permanente.

Tem-se falado em governamentalização, mas acha então que há o inverso?
Desde o tempo de Sá Carneiro que nunca um primeiro-ministro foi tão atacado nos tribunais e na imprensa. A posição que tomei foi em defesa do Estado de direito. Eu tenho vergonha que no meu país nasçam processos assim, seja contra quem for, e que ao fim de seis anos continuem a alimentar certa comunicação social. É essa promiscuidade que denuncio, de processos que nascem para os jornais e de notícias que nascem para certos processos. (...)"

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Cândida Almeida

É sempre engraçado ouvir a Dra. Cândida Almeida dizer, sobre determinado processo, que não pode falar por estar em segredo de justiça e, de seguida, adiantar sempre alguma coisa, como por exemplo os crimes que poderão estar em causa, para que servem buscas, etc...

Nota: decididamente, somos um país de bufos e chibos. Ainda os arguidos não foram notificados da Acusação e já alguém se chibou à imprensa do teor desta.

"Belémgate"

Há 3 dias, fiz este post. Porém, não o expliquei, pelo que aqui ficam os devidos esclarecimentos...
Para quem não sabe, também escrevo no Pátio das Conversas, ficando o Legalices adstrito às questões jurídicas, ao Direito e à Justiça. E é no Pátio que escrevo as minhas opiniões políticas, desportivas, sociais, etc. E o post da passada terça-feira referia-se a um tema político que me levou a levantar uma questão jurídica.
O tema em causa é o chamado Belémgate e as suspeitas de o Presidente ter encomendado, através de um assessor, uma notícia para prejudicar o Primeiro-Ministro e o governo e o partido a que este pertence. O caso é sobejamente conhecido e, penso eu, não há ninguém que não saiba o que está em discussão. E uma das questões que precisamente eu levantei foi o eventual crime praticado pelo assessor (escrevo "eventual" porque, apesar das fortes suspeitas, não há a certeza e tal deveria ser investigado por quem de direito). O título do post - em tom irónico - é, aliás, uma pergunta que Cavaco Silva deixou na sua mensagem de terça-feira...
A minha opinião, política, sobre este caso pode ser lida, por exemplo, aqui, aqui, aqui, aqui ou aqui. E sobre a eventualidade de se abrir um procedimento de impeachment ao Presidente já me pronunciei aqui e aqui.
Recordo, ainda, que em França iniciou-se, no passado dia 21 de Setembro, o julgamento do antigo Primeiro-Ministro Dominique de Villepin, que está acusado de ter forjado um documento, o qual provaria que o seu então concorrente à candidatura ao Eliseu (Nicolas Sarkozy) tinha recebido dinheiro ilegal num negócio de armas. A acusação é, precisamente, de difamação. Por isso, apontei o crime de difamação como um dos possíveis no chamado Belémgate.
Para além dos esclarecimentos, termino com um pedido de desculpas para quem, não lendo o Pátio das Conversas, não compreendeu o post.