segunda-feira, 17 de março de 2014

Ditadura económica

O texto de Pacheco Pereira publicado sábado no Público diz muito sobre o momento político e mediático que vivemos. E diz mal. O País tem piorado e vai continuar a piorar, apesar dos truques de ilusionismo dos artistas que nos governam. E daqui a 20 anos os livro de História escreverão sobre este momento e sobre este grupo de rapazolas, jovens turcos, ou lobos, como os queiram caracterizar. E escreverão mal, obviamente.

sexta-feira, 7 de março de 2014

O País funciona mal (2)

"1. A história da falência da Throttleman e Red Oak, duas marcas de vestuário português que fecharam as lojas na semana passada, é o melhor exemplo de como, por debaixo da demagogia sobre o Portugal de sucesso, a vida prossegue, inexorável, a matar a pequena e média economia portuguesa. Esta história é tão irreal (e não é a única) que até dá vontade de fugir do país.
Antes de mais: a Throttleman foi criada em 1991 por três gestores (Pedro Pinheiro, Eduardo Barros e Nuno Gonçalves) acabados de sair da faculdade. O profeta do cavaquismo industrial, Mira Amaral, pedia, e bem, marcas próprias e redes de lojas nacionais, sobretudo em setores como o do vestuário onde vendíamos esmagadoramente para subcontratação. Quem ousasse devia até internacionalizar.
A Throttleman fez isso mesmo: lojas nos shoppings ao lado das grandes Zaras, Benettons ou Lacoste. Vendia camisas portuguesas e outro vestuário a preço médio-alto. Chegou a dar emprego a quase 750 pessoas. E chegou a abrir lojas nos Emirados Árabes Unidos e em Angola - em resumo, fez o que está escrito nos livros de gestão. Só que a derrocada de 15 de setembro de 2008, nos Estados Unidos, provocou o brutal arrefecimento do consumo mas não o da conta mensal de quem tinha investimentos a pagar. Uma média de 12 milhões de vendas anuais revelavam-se insuficientes.
Os 23 milhões de euros de passivo acumulado pela Throttleman e Red Oak levaram então a que, em novembro de 2012, ambas avançassem para o "Processo Especial de Revitalização", um mecanismo criado pelo Estado para ajudar empresas em dificuldades. Viáveis ou não? Os credores decidiriam. E neste caso as coisas correram de forma extraordinária: em apenas 76 dias conseguiu-se um acordo com cerca de 80% de créditos, incluindo a Segurança Social. Quem faltou? Praticamente apenas o Ministério das Finanças, ainda por cima credor privilegiado.
Aceite pelo tribunal o Plano de Recuperação, vida nova? Errado. As Finanças interpõem um recurso judicial que impediu a recuperação de arrancar. Há um ano. Apesar das Finanças e da Segurança Social terem assegurado o ressarcimento de 100% da dívida em 150 prestações, acrescidas de juros a uma média de 6,25%, as Finanças não aceitaram que os juros antigos e as coimas fossem perdoados em 80%. Uma gota no conjunto de todo o processo. (Note-se que, entretanto, as Finanças perdoaram 100% dos juros e 90% das coimas, em dezembro último, a quem pagou impostos em atraso por razões tão absurdas como fugas para off-shores, etc...).
A Throttleman andou 12 meses a lutar com as Finanças em recursos judiciais e depois o processo encalhou no Tribunal Constitucional. Entretanto, a gestão tornou-se impossível. Há dias anunciou o pedido de insolvência. Tinha 200 trabalhadores. As Finanças (e todos os outros) vão agora receber zero ou pouco mais.
 
2. Quando leio as notícias sobre o aumento da arrecadação fiscal, mês após mês, penso em casos como este e temo o pior. As Finanças estão a usar expedientes claramente selvagens para conseguir tirar o pouco que resta à economia. Penhoram tudo a toda a gente - até por pequenas multas. Sabem que os tribunais não funcionam e são inúteis como recurso dos contribuintes.
Uma empresa que recorra judicialmente contra o Fisco fica registada como incumpridora se não pagar à cabeça e é inibida de direitos básicos (ex: estágios profissionais apoiados). Passa a ter o seu nome publicado na lista "negra" dos devedores. Todos os meios valem. O novo sistema de fornecimento de informação - SAFT - obriga as empresas a porem nas mãos do Estado 100% da sua vida - clientes, preços, prazos, pagamentos.
As Finanças são um Estado prepotente (sem aspas nem metáforas), amoral, dentro de um país que tenta sobreviver à sistemática e brutal cobrança e aumento de impostos. Ainda vamos brevemente descobrir que boa parte do sucesso das exportações inclui também uma coisa óbvia: as mercadorias vão mas o lucro não volta. O Fisco está enganado se pensa que mete os empresários em campos de concentração fiscais (onde estão os trabalhadores por conta de outrem e pensionistas). O inimigo é comum - o Fisco. A ordem é "fugir". O ódio ao Estado é total. Lutar contra a carga fiscal é como militar na Resistência."

(Daniel Deusdado)

O País funciona mal (1)

De repente a internet foi-se abaixo. Já tinha sucedido o mesmo há cerca de 10 dias e, na altura, liguei para o apoio ao cliente da PT e, pelo telefone, resolveram-me o problema. Tive que fazer um pouco de ginástica, ao desligar e voltar a ligar os cabos todos, mas 15 mins depois de ter falhado, voltei a ter internet. Era o router, que "perdeu contacto com a linha"...
Tal como da outra vez, liguei de imediato para o apoio ao cliente, a pagar claro. Mas desta vez, decidi exercer um direito: não aceitar a gravação da chamada. Para quem não tenha tido a infeliz experiência de ligar a um destes serviços de call center e não saiba disto, no início da chamada a gravação diz-nos que podemos dizer ao operador que não autorizamos a gravação da chamada. No caso do serviço telefónico de apoio ao cliente da PT (16209), o aviso é de que se não pretendemos a gravação, teremos de optar pelos canais alternativos de comunicação com a PT. Ir à loja, estão a ver?
Um rapaz atendeu, identificou-se e a primeira coisa que disse era que não autorizava a gravação da chamada. Ele responde-me de imediato que, não autorizando, eu teria de optar por outras formas de contacto com a PT, pois sem gravação, não poderia prosseguir com a chamada e o atendimento... Eu disse-lhe que estava sem internet, que o problema era certamente com o router e a primeira coisa que eles própios pedem (ainda na gravação automática antes de um operador atender a chamada) é que não poderemos sair do pé do computador e do router!
Ele insistiu que as instruções que têm é que não podem prosseguir com a chamada. E eu insisti que o que ele estava a fazer era violar o contrato e a lei (que os obriga a prestar apoio técnico), para além de me impedirem de exercer um direito constitucional e legal. Ele insistiu, alegando que o "sistema" não permite parar a gravação e que nem todas as chamadas eram gravadas e que o dito "sistema" escolhia aleatoriamente as chamadas a gravar. Pedi para falar com o supervisor, dizendo-lhe que, por acaso, conhecia quem tivesse trabalhado num call center semelhante e que o todos os sistemas, até porque é obrigatório por lei, terão de possibilitar a paragem da gravação por parte do operador em cada caso, através de uma ferramente informática no computador do operador. E acrescentei que, por acaso, sou advogado e que este comportamento é manifestamente ilegal e daria azo a coimas e processos, em caso de queixa e reclamação. Ele insistiu e tentou falar com o supervisor. Passados alguns segundos, diz-me que não está disponível, mas que, no máximo em 30 mins, a "supervisão", para onde tinha sido encaminhado o caso, entraria em contacto comigo relativamente à questão da gravação. Quando ao apoio técnico, nada...
Volvidos cerca de 20 mins, ligam da tal "supervisão". Outro rapaz, com voz de puto formado à pressa para call centers, começa por dizer que aquela chamada seria gravada! Eu desato-me a rir e peço, mais uma vez, que não autorizava a gravação. Ele diz-me a mesma coisa que o outro, que não autorizando, não poderia continuar com a conversa!
Eu identico-me como advogado, realço que a apoio técnico teria que ser prestado, obrigatoriamente, por telefone e que as chamadas, por estar em causa o direito constitucional à privacidade, só poderão ser gravadas após autorização do cliente, ou em caso de não oposição após ter sido avisado da gravação (no caso da PT). E que, ao recusarem-se prestar apoio técnico nos casos em que o cliente opta por exercer um direito é ilegal e constitui uma violação grave da legislação e do contrato. Peço-lhe para passar ao seu supervisor. Ele responde-me que ele não tem supervisor. Eu digo-lhe que em qualquer empresa, existe sempre um superior hierárquico até chegarem ao CEO! Ele diz que não tem ninguém a quem passar. Eu respondo-lhe que, quando apresentar queixa à Anacom (regulador) e à PGR (Procuradoria-geral da República), de certeza que tais queixas chegarão aos seus superiores hierárquicos, nomeadamente ao departamento jurídico. Ele insisiste que são as regras, eu digo-lhe que acabaram de perder um cliente, pois não se trata assim um cliente (pelos vistos, não lhes interessa ter clientes e mantê-los satisfeitos) e que a concorrência agradece a "delicadeza" da PT nem se viola de forma tão grosseira e grave a legislação e os contratos. Ele disse lamentar a minha decisão. Temos pena...