sexta-feira, 30 de abril de 2010

Dúvidas

1. Ainda em relação ao Acórdão da 9ª Secção da Relação de Lisboa, que entendeu não ter havido crime de corrupção por parte do empresário Domingos Névoa, persiste uma dúvida: porque é que o empresário não foi condenado por um outro crime que não a corrupção? É que o próprio Acórdão admite ter sido praticado um outro crime (por exemplo: favorecimento pessoal, suborno, tráfico de influências, etc). Não poderia ter existido uma alteração não substancial dos factos e ter sido alterada a Acusação para um destes tipos de crime?

2. Ontem foi conhecido um outro Acórdão, também da Relação de Lisboa, que confirmou a decisão do Ministério Público em não acusar João Miguel Tavares pelo crime de difamação contra Sócrates. O principal argumento, a acreditar na imprensa, é que o que é dito enquanto opinião não tem de ser verdadeiro e "não está sujeito à regra da prova da verdade dos factos".
Com base neste argumento, façamos então o seguinte exercício: adaptemos o texto de JMT e, em vez de falarmos do PM, falamos, por exemplo, de um Juíz:

"Ver (nome de um Juiz) apelar à moral na Justiça é tão convincente quanto a defesa da monogamia por parte de Cicciolina. A intervenção do (nome do Juiz) na abertura do ano judicial do passado fim-de-semana, onde se auto-investiu de grande paladino da "decência na nossa vida democrática", ultrapassa todos os limites da cara de pau. A sua licenciatura manhosa, as decisões duvidosas no Tribunal X, o apartamento de luxo comprado a metade do preço e o também cada vez mais estranho caso judicial não fazem necessariamente do Juiz um homem culpado aos olhos da justiça. Mas convidam a um mínimo de decoro e recato em matérias de moral.
(nome do Juiz), no entanto, preferiu a fuga para a frente, lançando-se numa diatribe contra directores de jornais e televisões, com o argumento de que "quem decide é o Juiz porque em democracia os Tribunais é que decidem". Detenhamo-nos um pouco na maravilha deste raciocínio: reparem como nele os planos do exercício do poder judicial e do escrutínio desse exercício são intencionalmente confundidos pelo (nome do Juiz), como se o cargo de Juiz servisse para aferir inocências e a avaliação do Conselho Superior de Magistratura fornecesse uma inabalável imunidade contra todas as suspeitas. É a tese Fátima Felgueiras e Valentim Loureiro - se o povo vota em mim, que autoridade tem a justiça e a comunicação social para andarem para aí a apontar o dedo? (nome do Juiz) escolheu bem os seus amigos.
Partindo invariavelmente da premissa de que todas as notícias negativas que são escritas sobre a sua excelentíssima pessoa não passam de uma campanha negra - feitas as contas, já vamos em quatro: licenciatura, decisões judiciais, apartamento e o caso do arguido (nome), (nome do Juiz) foi mais longe: "Não podemos consentir que a democracia se torne o terreno propício para as campanhas negras." Reparem bem: não podemos "consentir". O que pretende então ele fazer para corrigir esse terrível defeito da nossa democracia? Pôr a justiça sob a sua nobre protecção? Acomodar o procurador-geral da República nos aposentos de gabinete do Juiz?
À medida que se sente mais e mais acossado, (nome do Juiz) está a ultrapassar todos os limites. Numa coisa estamos de acordo: ele tem vergonha da justiça portuguesa por ser "terreno propício para as campanhas negras"; eu tenho vergonha da justiça portuguesa por ter à frente dos seus destinos um homem sem o menor respeito por aquilo que são os pilares essenciais de um regime democrático. Como jurista e como Juiz, não faltarão qualidades a (nome do Juiz). Como democrata, percebe-se agora porque gosta tanto de Hugo Chávez."

Quase que apostava que nenhum Juiz neste país mandaria arquivar o processo, alegando que não houve difamação. Mas isto sou eu, que não sou bruxo nem faço apostas...

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