segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Assistente

Na passada sexta-feira foi levantada uma questão pertinente sobre a figura do Assistente. Isto porque um jornalista se constituíu Assistente no processo Freeport e, aproveitando esse estatuto, teve acesso privilegiado aos autos, favorecendo o seu trabalho jornalístico.
A figura do Assistente em processo penal encontra-se prevista nos art.ºs 68º e seguintes do CPP.
Em primeiro lugar, devemos ter em conta que a figura do Assistente existe por duas razões: entende-se que as vítimas devem ter uma voz activa no processo; como tal, devem poder colaborar com o Ministério Público. Ora, a função do MP é colaborar na descoberta da verdade (art.º 53º do CPP) e não, como alguns possam pensar, acusar, mesmo que tenha dúvidas sobre a culpabilidade do arguido. Claro que acusa e toma partido, sendo parte no processo e assumindo uma posição clara. Mas isto só sucede (ou deveria suceder) depois de criar a convicção da culpabilidade. Ou seja, o MP faz um primeiro julgamento, imparcial, e se concluir pela culpabilidade, acusa. Mesmo que, mais tarde em julgamento, não se faça prova e, aí, possa pedir a absolvição em sede de alegações finais, como acontece não raras vezes.
Mas, enquanto o MP assume um papel diferente e até um pouco paradoxal, o Assistente é parte no processo e assume uma função bem clara e inequívoca: procurar a condenação. Foi com esse objectivo que foi criada a figura e é para isso que serve em processo-crime. É verdade que, em certos casos, qualquer pessoas possa constituir-se assistente, mas apenas porque se trata de crimes em que os cidadãos em geral são vítimas (como, por exemplo, a corrupção, pois esta destrói a sociedade) e terá, em qualquer dos casos, de mostrar um interesse legítimo.
A questão crucial é, assim, esta: será legítimo que um jornalista se constitua assistente, não porque tenha algum interesse especial no desfecho do processo mas apenas porque, dessa forma, tem acesso privilegiado às "notícias"?

A resposta não é fácil nem pode ser dada de imediato. Mas considero que existe um argumento que desequilibra esta discussão. Quando os processos são públicos, os jornalistas podem consultá-lo, pelo que a vantagem do assistente é ter acesso ao processo ainda durante o segredo de justiça (pelo menos externo) e, dessa forma, poder antecipar-se aos jornalistas que, só mais tarde, poderão consultar os autos. Ou seja, o objectivo não é participar no processo (e a figura do assistente foi criado precisamente com este fito) mas apenas colher benefícios pessoais que, de outra forma, não obteria. Claro que o jornalista tem direito a informar, mas o meio utilizado para o efeito é perverso e corrompe, por completo, a figura do assistente. É verdade que o Juiz autorizou, mas, tendo o jornalista admitido o propósito real da constiuição de assistente, poderia (poderá), até, ser condenado em multa por uso indevido do processo e má fé (art.º 456º do CPC), pois as prorrogativas do assistente foram criadas para as vítimas dos crimes poderem intervir activamente no processo e não para jornalistas poderem ter acesso privilegiado e antecipado à informação.

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