quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Carta aberta


Exmo. Sr. Primeiro-ministro
Exmo. Sr. Ministro das Finanças
 
 
Antes de mais e apesar de tudo, apresento os meus melhores cumprimentos.
Faço hoje 33 anos e o que deveria ser um dia feliz é, na realidade, um dia triste. Um entre muitos, que abundam por estes tempos. Sou ainda novo, mas sinto-me velho nesta espécie de país.
Sou casado, tenho uma filha com 18 meses e não vejo, neste momento, qualquer futuro para nós em Portugal. Vamos conseguindo sobreviver, mas, com este rumo – errado (lá chegarei) – não sei se o melhor mesmo não será seguir o conselho de V. Exas. para emigrar. Para um país melhor e mais justo, onde as pessoas não sejam cobaias de experiências económico-sociais.
Sou advogado e todos os dias vejo a Justiça a ser atacada por V. Exas e, em particular, pela sra. Ministra da Justiça, que, para satisfazer interesses privados, está a destruir o que resta da Justiça portuguesa. A minha mulher está a sofrer na pele as recentes alterações legislativas em matéria laboral. Para promover a harmonia entre patrões e trabalhadores, alegam V. Exas., para promover o sistema chinês, digo eu. Será que não há ninguém no governo que tenha a experiência e a capacidade de perceber que trabalhadores desmotivados e chantageados produzem menos? Não queriam, afinal de contas, aumentar a produtividade? Não conseguem – ou não quererão – entender que não é por mera coincidência que os países onde os trabalhadores teem mais regalias são aqueles onde produzem mais? E quanto à minha filha, com o regresso da Educação aos anos 60 e 70 do Séc. passado, não vejo como poderá, com justiça e mérito, aprender e crescer como pessoa e cidadã.

 
Quando V. Exa., dr. Pedro passos Coelho, se apresentou a eleições para líder do PSD, fiquei com a sensação de que representava (e representaria) uma “lufada de ar fresco”. Para além de jovem (na política, entenda-se), apresentava um ar sério, credível e determinado. Torci por si e acabou por vencer as referidas eleições. Seguiam-se as legislativas…
Com um governo fraco e alvo de constestação social, causada pelos sucessivos erros e por uma crise internacional (que “nasceu” no final de 2008 e não em Junho de 2011), as pessoas estavam ansiosas por alguém que mudasse o rumo e trouxesse esperança num futuro melhor. Não faltou quem o apelidasse de “Obama português”. O tempo trataria de mostrar o contrário, como hoje se percebe.
Apesar de algumas dúvidas e um certo cepticismo quanto a certas ideias e propostas, estava francamente inclinado a dar-lhe o meu voto. Mas houve dois momentos, aquando da apresentação do famoso PEC IV pelo governo de então, que decidiram tudo. O primeiro foi quando mentiu sobre ter sido surpreendido, na véspera, por um telefonema onde Teixeira dos Santos supostamente lhe transmitiu algumas das medidas que seriam apresentadas no Parlamento no dia seguinte. Como mais tarde veio a admitir, não tinha sido um telefonema, mas um encontro pessoal, que durou horas. O segundo momento foi quando justificou o chumbo do tal PEC IV por, supostamente, as medidas ali contempladas irem “longe de mais”, pedindo sacrifícios a mais aos porugueses. Outra mentira, como se provou com as declarações contrárias (e em inglês) a jornalistas estrangeiros e, posteriormente, na também já famosa frase “ir além da Troika”. Duas mentiras, dois momentos, uma decisão: já não votaria em si. Para votar num mentiroso, seria sempre menos mau votar em alguém que, apesar de todo o mal que fez, ainda pos o País a crescer e a evoluir até 2008…

 
O meu voto foi nulo (ninguém tinha as mínimas qualidade para governar) e, nas semanas seguintes, o tempo e V. Exa. acabaram por me dar razão. É que se tivesse votado em si, estaria agora, tal como milhares de portugueses, arrependido e indignado, revoltado com a pirueta que V. Exa. deu. Mas não foi só V. Exa., pois aquele que viria a escolher para Ministro das Finanças revelar-se-ia um teórico dos livros mas um ignorante da realidade portuguesa. Os resultados estão aí. Dizer que são um desastre é ser lisonjeiro. Por isso, dirigo-me, agora, para V. Exa., sr. Ministro.

 
O ano passado criticou a medida que tomou na última semana: descida da TSU para as empresas. Como explica esta (não menos extraordinária) pirueta? Os resultados da perda de poder de compra provam que a receita é errada e contraproducente. Se o objectivo é aumentar a receita (obter mais dinheiro, portanto), conseguiram reduzi-la ainda mais. E irão reduzir mais e mais, até isto afundar de vez. Quanto à (falta de) credibilidade estamos, pois, conversados. Não haverá ninguém no Ministério das Finanças, ou mesmo naquela espécie de ministério do “apenas Álvaro”, capaz e com inteligência e conhecimento suficiente para saber que, ao longo da História económica, o consumo é que faz funcionar a economia? Do sistema capitalista até ao (imagine-se) comunista, o consumo é o motor da economia. Sem consumo, não há economia que resista. Como pelos vistos não leram, recomendo que leiam um manual de macroeconomia. Qualquer um serve, mesmo os textos de Milton Friedman, vosso ídolo. Será que o sr. Ministro ouviu falar, quando tirou o curso, na Curva de Laffer? Ou será que faltou a essa aula, ou, pior, teve equivalência nessa cadeira?

 
Como nos últimos dias se viu, já ninguém coerente os apoia e defende as V/ políticas. O desastre a que V. Exas. condenaram o país pode ser bom para alguns, para Vós ou para os V/ amigos, mas não para o país e para a generalidade dos portugueses. E quando se governa não para todos mas para apenas alguns, a legitimidade esgota-se.
Se as ameaças do nosso pequeno Goebbels à jornalista do Público implicaram uma mudança do comportamento da comunicação social com o V/ governo (que vos cantava loas até então), o triste e patético episódio de dia 7 (comunicação ao país seguida de um texto no Facebook e uma ida a um concerto, quando o estado do país e o momento implicavam recato e não divertimento) viraram a página em termos políticos. Se alguém ainda vos concedia o benefício da dúvida e ainda acreditava em V. Exas, agora já ninguém conseguirá ser enganado. Tirando, claro, os assessores que pulula na blogosfera e nas redes sociais a citar o famoso guião, ou manual…
Desde inúmeras vozes dentro dos dois partidos que vos sustentam, a empresários e representantes dos vários sectores da sociedade, todos são unânimes: a vossa política é errada, está a produzir os efeitos contrários aos pretendidos e está a destruir o país. O meu país. Quanto ao “vosso” país, esse já não sei, porque as vendas de automóveis de luxo continuam a aumentar, os imóveis acima de um milhão de euros continuam a ser vendidos e os filhos de muita gente continuam a percorrer o Ensino no privado, com qualidade e financiado pelos restantes, pobres e espezinhados por V. Exas. E, claro, continuam com acesso aos melhores cuidados de saúde, ao contrário da esmagadora maioria da população. “Esse” país não sei como estará agora, mas desconfio que na mesma. V. Exas estão sós. Orgulhosamente ou não, é que não sei.

 
Eu bem sei que V. Exa, sr. Primeiro-ministro, se está a “lixar” para as eleições, mas não pode estar a lixar-se para os portugueses, como tem mostrado estar. Se não fosse a passividade cúmplice do pobre pensionista de Belém, o sr. Silva, e a estranha contumácia do que dizem ser o líder do PS, António José Seguro, V. Exas. já tinham sido colocados no devido sítio e já tinham posto travão ao crime que estão a praticar. Porque se a Troika veio para encher os bolsos (os juros cobrados pelo empréstimo são usurários), as medidas concretas são vossas e só vossas. De mais ninguém. E não vale a pena atirar areia para os olhos, alegando que foi o anteriro governo a assinar o memorando, pois ele já foi revisto várias vezes e o original já foi quase todo alterado. Por V. Exas, repito.

 
Como o texto vai longo e certamente que será apenas lido por um qualquer assessor cujo único mérito será o der ser militante do V/ partido e posteriormente rasgado, é altura de concluir, pedindo a V. Exas. que pensem na triste figura que estão a fazer aos olhos dos portugueses, que pensem nas V/ famílias, nas famílias dos outros e se demitam. É o mínimo a fazer, atendendo que, dia após dia, parecem querer provar que conseguem ser ainda piores que os V/ antecessores. É que, não o fazendo, habilitam-se a ser criminalmente responsabilizados. E é o que mereciam. Tenham vergonha e dignidade, para bem da minha família e dos milhões de famílias que estão a ser aterrorizadas por V. Exas. É que eu e milhões de portugueses podemos emigrar para um sítio melhor e V. Exas migrar para um qualquer "tacho" numa qualquer administração de uma grande empresa, a ganhar ordenados chorudos e incompatíveis com o V/ mérito e a V/ competência, mas o país fechará portas e deixará de existir como tal. Espero, sinceramente, que não. Que V. Exas. sejam travados o quanto antes.
 
 
Atenciosamente, apesar de tudo.
(nome completo)

1 comentário:

Ricardo Sardo disse...

Enviada por e-mail para os gabinetes do PM e do Ministro.