terça-feira, 28 de outubro de 2008

Escalas para processos criminais

O artigo 41.º da Lei do Apoio Judiciário diz-nos que "a nomeação deve recair em defensor que, constando das escalas de prevenção, se apresente no local de realização da diligência após a sua chamada".
A Lei do Apoio Judiciário (Lei 47/2007) remete a regulamentação do regime de escalas para a Portaria 10/2008, que nos diz, no nº1 do artigo 3º, que "a nomeação para assistência ao primeiro interrogatório de arguido detido, para audiência em processo sumário ou para outras diligências urgentes previstas no Código de Processo Penal é efectuada pelo tribunal através da secretaria, com base na designação feita pela Ordem dos Advogados constante da lista de escala de prevenção de advogados e advogados estagiários."

A primeira conclusão que se retira é que a nomeação de advogados (que constem em lista de escala de prevenção) é feita para os casos acima elencados, não estando expressamente prevista a hipótese de nomeação para diligências em que falte o advogado nomeado ou constituído, como, por exemplo, audiências de julgamento em processo comum.

O Código de Processo Penal, relativamente a esta matéria, apenas estabelece que "se o defensor, relativamente a um acto em que a assistência for necessária, não comparecer (...) é imediatamente nomeado outro defensor."
Ou seja, nada diz sobre quem deve recair a nova nomeação, pelo que deve aplicar-se o regime de acesso ao direito (apoio judiciário) que, por sua vez, estipula que a nova nomeação deve recair sobre advogado que esteja "de escala".

E aqui chegamos ao cerne da questão: na prática o que acontece é que, faltando um defensor numa audiência de julgamento, deve a secretaria entrar em contacto com advogado que esteja "de escala" para se deslocar ao tribunal em questão (as escalas deixaram de ser "presenciais" - artigo 4.º, nºs 2 e 4 da Portaria 10/2008), após a confirmação de que o defensor constituído ou anteriormente nomeado não compareceu.
Ora, como é sabido de quem anda nestas "andanças", alguns Juízes não aplicam esta regra e perguntam a outros advogados presentes se estão dispostos a aceitar a defesa do arguido.

Antes do actual regime, já existiam escalas de prevenção, presenciais, e também já existiam casos de "candonga", em que advogados (efectivos ou estagiários) estavam presentes na sala e, faltando um defensor, eram logo nomeados pelo Magistrado, que não estava para esperar sequer 5 minutos (que é o tempo máximo que o advogado de escala levava da sala onde esperava para a sala de audiências).
Precisamente para evitar este tipo de estratagemas de alguns advogados para terem mais processos (e mais remunerações, claro) é que foram criadas as escalas. Muito recentemente, o actual Bastonário da Ordem dos Advogados enviou um e-mail para os advogados a informar de que aceitar nomeações quando haja colegas (advogados) "de escala" constitui infracção disciplinar e, consequentemente, dá direito a processo disciplinar.
Ora, já tem acontecido que alguns Juízes, que não estão para esperar pelo advogado que está "de escala", nomeiam outros advogados presentes para outros processos e alguns até têm recusado a nomeação, precisamente para evitar processos disciplinares.

Por um lado, convinha a OA emitir um parecer a esclarecer esta situação (pessoalmente irei pedir um parecer neste sentido), concretizando as normas deontológicas que proibem os advogados aceitarem nomeações nas condições acima descritas, e, por outro, convinha também que os Juízes que insistem em não chamar advogados "de escala" entendam que a legislação deverá ser respeitada, mesmo que discordem dela. Eu também discordo e respeito-a.
Se é verdade que este novo sistema não faz muito sentido e as escalas "presenciais" talvez sejam a melhor solução (não é por acaso que no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa as escalas sejam "presenciais"), a verdade é que a lei é para ser cumprida.


Nota: António Martins, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, desafiou há dias o bastonário da Ordem dos Advogados a apontar qualquer caso em que algum juiz tenha recusado aplicar a lei por discordar dela. Ora aqui fica (como tudo indica) um exemplo.

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