Era para ter publicado estes dois textos mais cedo, mas só hoje consegui terminar a análise aos programas do PS e do PSD para a área da Justiça.
Começo pelo PS, que pode ser lido aqui (págs. 97 a 104), pois é quem está em funções. Para além da análise às propostas inseridas no programa de Governo, será também feito um género de balanço aos 4 anos de governo nesta área, que o programa, aliás, refere.
Vamos, então, por pontos:
1. Simplificação e desburocratização
O objectivo é, sobretudo, o aumento da celeridade e a redução dos custos. Algumas medidas foram tomadas nestes 4 anos, como a simplificação (em regime experimental) do processo civil, reorganização dos tribunais (novo Mapa Judiciário) ou a redução das férias judiciais. Se não correram mal, também não se pode dizer que correu lá muito bem. A redução das férias provocou uma oposição generalizada dos operadores da Justiça e os benefícios foram mínimos, o Mapa Judiciário trouxe vantagens mas também problemas, como a distância de alguns tribunais a algumas localidades (sobretudo na Comarca do Alentejo Litoral), necessitando de ser revisto.
O PS propõe ainda, em paralelo com o regime simplificado do processo civil, um novo processo laboral, mais célere e eficiente. Mas não chega para avaliar esta vaga ideia. Teremos de esperar pela proposta concreta do novo Código de Processo do Trabalho.
Defende, também, o alargamento do programa Citius para os tribunais superiores. Fica a dúvida se também será alargado para o processo penal na próxima legislatura, como inicialmente previsto.
Os julgamentos passarão a ser gravados em vídeo.
2. Celeridade
Uma das medidas mais importantes poderá ser a compensação dos cidadãos pelos atrasos nas decisões, como por exemplo a redução das custas.
Obviamente que esta ideia é boa, mas terá de ser muito bem explicada, sobretudo em que moldes será aplicada. Por exemplo, se um Juíz levar 90 dias a emitir uma Sentença, quando o prazo legal é de 30 dias, haverá consequências para o mesmo caso o Estado arrecade menos custas?
3. Transparência, pontualidade e previsibilidade
Uma das propostas nesta matéria é a previsibilidade das decisões, isto é, cada cidadão (ou advogado) pode perguntar aos serviços quanto tempo deverá esperar por determinada decisão.
Resta saber se, depois na prática, isto acontecerá mesmo...
Uma outra proposta é a de criar "novos mecanismos para a uniformização de jurisprudência e novas formas de trabalho cooperativo dos tribunais, de modo a diminuir as discrepâncias no tratamento de situações semelhantes". Ora, esta frase é demasiado vaga. A ideia será a de evitar sentenças contraditórias, mas considero que isso será extremamente difícil, já que todos os juízes pensam de maneira diferente e, peranta a mesma situação, podem ter entendimento diferentes, pois a lei é, infelizmente, demasiado vaga, abrangente e dúbia. Para esta medida ser possível, teria que haver uma revisão geral da legislação em vigor, de forma a corrigir os enormes lapsos e omissões.
4. Meios alternativos de resolução de litígios
Os Julgados de Paz são, neste momento, vistos como uma solução boa, barata e eficiente. A ideia é de outro governo, mas este alargou a rede de julgados, abrangendo cada vez mais localidades, sobretudo os grandes centros urbanos, onde os pequenos litígios como que pedem uma resolução rápida e quase amigável, já que a primeira fase do processo é a mediação entre as partes.
A mediação, alargada para outros ramos do direito (laboral, penal, família e menores, consumo, etc) veio para ficar. Alguns criticam (o Bastonário da Ordem dos Advogados, por exemplo), mas considero essencial para a celeridade da Justiça, pois retira dos tribunais pequenos litígios que podem muito bem ser resolvidos com uma reunião orientada por um mediador imparcial.
A proposta do PS, nesta matéria, passa pela criação da mediação fiscal.
5. Prevenção e punição da criminalidade
A proposta começa pelo reforço dos meios ao dispor do Ministério Público e dos órgãos de polícia criminal, em especial a Polícia Judiciária. Acontece, porém, que nestes 4 anos que agora terminam, esta tem sido uma das principais falhas do governo, já que o MP continua com escassos e insuficientes meios (informáticos, por exemplo) e a PJ continua a debater-se, diariamente, com falta de pessoal e de meios para, por exemplo, efectuar perícias.
O programa fala também numa avaliação a ser feita em matéria de legislação penal, baseada no parecer final da comissão de avaliação para a reforma penal (de 2007 e que muita polémica criou). Como já todos os operadores da Justiça concluiram, o código de processo penal terá de ser revisto, nomeadamente em matéria de segredo de justiça, uma das áreas mais sensíveis, nem que seja pelo facto de vivermos num país onde há muitos 'chibos' e a violação ao segredo (que é crime) é o prato do dia.
6. Parque judiciário
O programa fala em modernização das instalações dos tribunais, algo que, diga-se, tem sido feito com obras de requalificação e construção de novos tribunais. O problema é que este tipo de obra tem, obrigatoriamente, de respeitar certas especificidades inerentes ao tipo de instalações. O novo Campus da Justiça de Lisboa é o exemplo perfeito da total inadptação das instalações ao tipo de serviços que albergam. As instalações foram feitas para escritórios e não para tribunais (criminais) e os problemas e defeitos estão à vista de todos. Erros como este não podem ser repetidos.
7. Corrupção
Nesta matéria, o programa é bastante vago, limitando-se a algumas medidas adoptadas nestes 4 anos de governo socialista. Propostas concretas não dislumbro nenhuma, o que é mau.
Em forma de conclusão, dir-se-á que as propostas são boas, mas muitas delas necessitam de aprofundamento e concretização, já que são demasiado vagas para serem analisadas. Se o governo que agora cessa funções fez um trabalho globalmente satisfatório na área da Justiça, tal deve-se aos secretários de estado (Conde Rodrigues e João Tiago Silveira) que implementaram algumas medidas boas, com o Mapa Judiciário e o Citius (isto, apesar dos defeitos), pois o Ministro Alberto Costa mostrou uma total impreparação para o cargo que ocupa. Certamente que, vencendo o PS as eleições no próximo Domingo, será um dos Ministros a não renovar mandato. E ainda bem.
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