Sobre as recentes propostas de alteração do regime legal do IVA, a ler este texto no Diário Económico (via Câmara Corporativa):
"O Movimento IVA com recibo defende a introdução de um regime generalizado de exigibilidade de caixa (REC) no IVA para PME. Este consistiria em diferir o momento da exigibilidade de pagamento do IVA para o momento do pagamento do preço pelo adquirente dos bens ou serviços.
A regra geral no IVA comunitário é a de os sujeitos passivos (SP) efectuarem o pagamento do IVA em função do momento em que as transmissões de bens ou as prestações de serviços ocorram. O facto gerador ocorre e o imposto torna-se exigível no momento da entrega de bens ou da prestação de serviços. A introdução de um REC só pode ocorrer em derrogação à regra geral. Tal derrogação tem por base normas consideradas como complementares das relativas ao nascimento do direito à dedução do IVA suportado a montante.
Com efeito, nas operações entre SP, no exacto momento em que o IVA é devido ao Estado pelos vendedores dos bens ou pelos prestadores de serviços, também os seus adquirentes ou destinatários podem exercer o direito à dedução do correspondente montante.
Assim, por exemplo, se, no regime trimestral, um SP tem de entregar o IVA ao Estado até ao dia 15 do 2.º mês seguinte ao final do trimestre em que realizou operações tributáveis, é igualmente certo que, dentro do mesmo prazo, pode deduzir a seu favor o IVA relativo às suas aquisições de bens e serviços, mesmo que ainda não tenha pago o respectivo preço. Intrinsecamente ligada ao direito à dedução, a exigibilidade integra a zona harmonizada do IVA. Por isso, a Comissão entende que a introdução de um REC só é possível em situações excepcionais, sendo aplicável a um certo tipo de operadores ou de operações ou a um ramo de actividade especificado e autonomizável e devendo o EM solicitar tal derrogação ao abrigo do disposto no art. 395.º da Directiva de Consolidação do IVA.
Assim, um REC só é autorizado se respeitar a uma medida de simplificação da cobrança, se não houver afectação significativa de receita do IVA cobrado no consumo final e se se dirigir a um grupo determinado de sujeitos passivos. Além disso, a derrogação só é concedida se não puser em causa os princípios basilares do IVA da neutralidade e da não distorção da concorrência. Dada a natureza excepcional e restritiva do REC, a generalidade dos EM não o aplica, ou aplica-o apenas em situações específicas, após autorização comunitária. É o que ocorre com uma decisão do Conselho de 30 de Janeiro de 2007 autorizando 4 EM a aplicar um REC. As derrogações existentes seguem todas esquemas semelhantes.
Assim, o regime da Estónia dirige-se a sociedades unipessoais e os regimes esloveno e inglês a sujeitos passivos com volume de negócios até um certo montante. A aplicação de um REC a esses tipos de SP comporta, porém, inúmeras condicionantes e excepções, nomeadamente em função da natureza das operações ou das condições de facturação.
Entre nós, o legislador adoptou o regime comunitário que liga a exigibilidade à data da emissão da factura. Daí que o adquirente possa deduzir imediatamente o IVA suportado no exercício em que recebe a factura. Portugal foi, porém, autorizado a criar um REC em duas situações pontuais: no caso das empreitadas e subempreitadas de obras públicas em que são donos da obra o Estado, as Regiões Autónomas ou certos institutos públicos e no das entregas de produtos da sua própria exploração agrícola feitas por cooperadores às cooperativas agrícolas.
Para o Movimento, as vantagens da adopção generalizada do REC consistiriam na aproximação dos momentos de pagamento do imposto ao contribuinte e deste ao Estado. Contudo, mesmo que fosse possível um REC generalizado, são omitidas as suas desvantagens. A adopção de um REC implica que, enquanto não for feito o pagamento, não pode ser feita a dedução do imposto. Este facto é obviamente penalizador e desvirtua a lógica do IVA como imposto de consumo de bens e serviços, facto que nada tem a ver com o momento do pagamento do preço.
A intervenção comunitária na aprovação de um REC justifica-se por estarmos na zona harmonizada do IVA e por se tratar de um regime excepcional. Uma ampla aplicação deste regime à generalidade das PME transformaria a excepção em regra, feriria o princípio da neutralidade e geraria distorções de concorrência em relação a outros operadores que praticassem idênticas operações ou que actuassem no mesmo ramo de actividade.
Além disso, uma tal ampliação comportaria riscos de aumento de evasão fiscal, porquanto o fisco passaria a ter, na quase generalidade dos casos, de provar que os SP já tinham recebido o preço referente às transmissões de bens ou prestações de serviços por eles efectuadas. Não lhe bastaria assim, contrariamente ao que é razoável num imposto de consumo, demonstrar que as referidas operações de transmissão de bens ou de prestação de serviços tiveram efectivamente lugar.
António Carlos dos Santos, Professor da UAL"
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