segunda-feira, 6 de abril de 2009

Ónus da prova e pressões

1. "Cá por mim, tanto se me dá, como se me deu que invertam o ónus da prova. Mas estas «inovações» nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos pagam-se, mais cedo ou mais tarde. O Estado começa com pezinhos de lã, em matérias em que ninguém lhe leva a mal, como o enriquecimento ilícito. Depois, aos poucos, vai estender o princípio consignado na lei e admitido constitucionalmente a outros crimes, aliviando o Ministério Público duma carga de trabalhos. Virá o dia em que o Estado acusa um cidadão da prática de um qualquer crime e o cidadão que se amanhe e prove a sua inocência num processo kafkiano. No fundo, é caminhar para as práticas da Inquisição e dos Processos de Moscovo. O Estado democrático dá todos os dias passos largos a caminho do Estado totalitário. Já quase não damos conta como a vigilância e a prepotência do Estado sobre os cidadãos se ampliou depois de 11 de Setembro de 2001, mesmo sem falar em Guantánamo. Somos todos suspeitos de qualquer coisa. Em nome de uma causa nobre: a luta contra o terrorismo, como nobre é a luta contra a corrupção e o enriquecimento ilegítimo. (...)
Como diria Brecht: Agora estão me levando/ Mas já é tarde. /Como eu não me importei com ninguém/ Ninguém se importa comigo."

(Tomás Vasques, no Hoje há conquilhas)


2. "(...) Nos tempos que correm nunca sabemos quando um procurador se pode sentir, ofendido, ameaçado, intimidado, pressionado, influenciado ou outras coisas próprias de gente sensível e temerária. (...)
Não convém sequer falar de meteorologia, ninguém sabe se o procurador é agricultor nos fins-de-semana e qualquer previsão de seca se transforma uma praga, se o homem for supersticioso imagina logo que está a desejar que sobre as suas terras caia uma praga de gafanhotos. Vai para casa, não dorme a pensar na desgraça que se avizinha, deixa de poder investigar com a necessária serenidade, acorda sobressaltado a meio da noite, pega no telefone e liga ao senhor Palma a denunciar que foi vítima de uma intimidação. Vão descobrir que o procurador está a investigar os dinheiros numa off-shore, que lá estão depósitos de um primo do seu vizinho com quem toma regularmente a bica, isto é, a praga foi lançada a pedido do vizinho. (...)"

(O Jumento)

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